Descobrindo o Amor.



CAPÍTULO UM
O encontro

 Em uma pequena casa, em uma das regiões mais pobres de Brasília, reside uma família bastante humilde, porém culta. Sérgio é o mais velho de cinco irmãos; Os gêmeos Laísa e Marcos, de treze, Kenedi, de 10 e Denise de dois. Sua mãe sempre se esforçou bastante para sustentá-los, seu pai os abandonou quando ele tinha apenas cinco anos. Sua mãe sempre foi carinhosa, e o deu a melhor educação que uma mãe pode dar, e isso fez dele um rapaz educado, inteligente, e caprichoso. Agora, com dezesseis anos, estava ali, parado em frente a uma enorme lista com demasiados nomes, na esperança de encontrar o seu ali, denunciando sua boa nota. Ele tinha estudado durante todo o ano justamente para fazer aquela prova, pois agora mais do que nunca ele precisaria de um bom ensino, já que no próximo ano teria que conseguir entrar na faculdade. Sabrina... Sabrina... Sabrina... Samara... Samara... Samara... Sérgio... Sérgio... Sérgio da Silva Andrade.
 Sim, ele tinha conseguido, ele continuou parado ali, sem reação, seus olhos já marejados de tanta emoção, ele finalmente ia estudar em uma escola de verdade, teria um ótimo ensino em uma escola tão prezada como aquela. Sérgio, o garoto pobre e humilhado muitas vezes em outras escolas agora está acima de todos os que o julgaram. Ele foi então até a secretaria pegar a lista de matérias quando esbarrou em uma garota de uma maneira tão brutal que a derrubou, ele se apressou em dar sua mão para ajudá-la a se levantar.
 - Desculpe! Eu... Não a vi... – A garota não aceitou sua mão e o fuzilou com o olhar, ela se apoiou no chão e se ergueu sozinha.
 - Jura? Nem deu pra perceber! Vê se olha por onde anda garoto. Afinal, o que está fazendo aqui? Os funcionários transitam por lá – Ela disse apontando pra o lado extremo da escola. Sérgio ficou boquiaberto com a atitude da garota, em outro momento ele teria admirado a garota de cabelos cor de ouro e olhos cor de esmeralda, mas não agora, não com ela o tratando daquele modo.
 - Eu não sou funcionário, querida, e não vejo motivo pra você me tratar assim. Eu já pedi desculpas. – Ela estava concentrada em sua tarefa de limpar suas vestes.
 - Olha, estou sem tempo para discutir com inúteis, com licença. – Ela o desviou e foi embora. Sérgio tinha certeza do motivo pelo qual a garota o tratou daquele modo. A patricinha além de mal educada era preconceituosa, deveras tê-lo chamado de funcionário apenas pelo fato dele ser negro. Ele não a conhecia, mas já havia tomado raiva, nojo. Sérgio sempre se orgulhara de sua origem, e também sempre foi alvo de preconceito e nunca abaixou a cabeça por isso. Seu pai e o pai de seus irmãos era branco, e todos eles nasceram com a etnia de seu pai, somente ele nasceu negro como sua mãe, e nunca se sentira mal ou humilhado por isso, mas sempre orgulhosa por ter herdado algo de sua mãe, já que suas feições eram todas de seu pai, de quem tomara grande raiva por deixar sua mãe. Ele continuou seu caminho até a secretaria, tomou sua lista e voltou para casa já imaginando a felicidade de sua mãe ao receber a notícia. A escola ficava longe da sua casa por situar-se em uma região rica, diferente da região da casa de Sérgio, era preciso pegar dois ônibus para chegar até ali, mas isso não o desanimara; Para sua sorte, assim que chegou na parada o ônibus desejado chegou.


 - Está com a cara marrada desde a saída da escola Rafaela. – Disse o motorista/mordomo/amigo de Rafaela, uma das garotas mais ricas do Lago Sul. Ela apontou para sua roupa de marca e soltou:
 - Será que você não reparou na minha roupa amassada? Ou até mesmo na minha calça suja? Tive o privilégio que esbarrar com um brutamontes no caminho de volta, que por sinal até agora não sei o que fazia lá no meio do caminho, no meio do meu caminho. – Bufou.
 - Bom, se vocês se esbarraram foi um acidente Rafinha... – uma tentativa em vão de acalmá-la – Mas e então, vamos esquecer isso, você sabe que estresse causa rugas? – A garota fez cara de espanto.
 - Oh, claro, eu havia me esquecido! Não posso ter rugas, não mesmo, ainda mais tão nova assim. Rodolfo, você se importa de comprar minhas coisas? Eu anoto aqui no papel tudo o que quero fora o essencial, ok? Não estou com paciência pra comprar materiais; preciso ir para a casa da Malu. Você pode me deixar lá e seguir para a papelaria. – Rodolfo fez que sim com a cabeça e fez a curva para deixá-la na casa de Malu, sua melhor amiga desde o jardim de infância. As duas pareciam fazer uma disputa de quem era mais patricinha, mas a disputa era acirrada, porém Rafaela era a dona da inteligência. Linda, rica e inteligente, isso com certeza a deixava no topo. Os únicos que suportavam as duas eram os garotos, quanto às garotas, todas as odiavam. Rodolfo estacionou em frente a uma mansão de cor amarelo bem claro, ela desceu deu um tchauzinho acompanhado por um sorriso para Rodolfo e se dirigiu ao interfone.
 - Mansão dos Wood o que deseja? – Malu era norte-americana, a família veio para o Brasil quando ela tinha cinco anos de idade, quando conheceu Rafaela.
 - É a Rafaela. – Ela disse impaciente por ter que fazer isso toda vez que vinha na casa de sua praticamente irmã.
 - Ah, só um segundo Dona Rafaela. – Assim que a voz se calou o portão abriu e ela caminhou sobre seus saltos caros ao chegar à porta já estava aberta a sua espera, ela entrou e olhou no hall a procura de Malu, e então avistou a baixinha de cabelos negros e brilhantes sentada na varanda com fones de ouvido, Rafaela se dirigiu até ela e retirou seu fone.
 - Estou cansada de toda vez vir na sua casa e ter que tocar aquele interfone e ouvir a voz irritante da sua empregada! – Sentou-se elegantemente na cadeira ao lado de Malu tomando seu mp3 e verificando a música. – Credo, Tim Maia, desde quando você ouve isso Maria Luíza? - Sua amiga até então calada fez uma careta se levantou o foi até ela.
 - Nem ao menos me cumprimenta? – Ela deu um beijinho na bochecha da Rafaela e se sentou novamente retomando seu mp3- Ah, eu já estava cansada das minhas músicas, resolvi ouvir algo novo. E o que você está fazendo por aqui? Não ia comprar suas coisas?
 - Ia, mas desanimei na volta da escola. Você não sabe o que me aconteceu. – Malu sentou-se mais ereta louca para ouvir a fofoca – Assim que peguei minha lista estava saindo quando esbarrei em um sujeitinho medíocre, você precisava ver, além de me jogar no chão ainda estendeu a mão, como se eu fosse tocar alguém como ele. – Ela fez cara de nojo e olhou para Malu, que estava com cara de paisagem.
 - Como assim “alguém como ele?” – Rafaela revirou os olhos.
 - Um negro Maria Luíza. Pior, um negro pobre. Pior ainda, ele não é funcionário, como pensei que fosse, e se ele não é funcionário...
 - O que ele estava fazendo lá? – Malu ainda sem entender.
 - Ai meu Deus! Ainda não sei como você consegue ser tão lenta. Um negro pobre em um bairro rico, ou melhor, em uma escola rica, e que não é funcionário só pode ser bolsista. – Ela revirou os olhos novamente. – Só o que me faltava, mas um para poluir a imagem da escola. - Malu enfim entendeu o que a amiga queria dizer, diferente dela, Rafaela era bastante racista, para ela, negros não tinham o direito de conviver com brancos, ela deixava descer todos os outros negros da escola por que apesar de negros eram ricos, mas se aparecera um negro pobre, ela sem dúvidas ia repugná-lo até o último dia de aula.
 - Ai meu Deus você Rafaela. Estamos em pleno século 21, ninguém tem mais essa de separar as pessoas por cor da pele, não sei porque você não se acostumou até hoje, a Mariana estuda conosco desde o jardim e é negra.
 - Nem me lembre daquela abominação! – ela levantou a mão em um gesto para Malu se calar.
 Logo depois elas tomaram um chá gelado e se dispuseram a falar de como foram boas as férias e sobre os novos alunos.
 - Você não sabe quem vai estudar lá!- Malu disse entusiasmada. – Aquele gato do clube de tênis! – Rafaela ficou boquiaberta por um instante.
 - Aquele Deus? Ah, enfim uma ótima notícia. – Nesse instante o celular de Rafaela tocou, era seu pai pedindo para que ela fosse para casa.
 - Bom, tenho que ir Maluzita! Eu te vejo amanhã no clube. – Ela deu um beijo de despedida e se retirou, com Rodolfo já a sua espera.
 Rafaela ficou o tempo todo pensando o porque do pai a ter pedido para voltar logo se ele nunca o fizera antes. Ela sempre ia e voltava da casa de Malu a hora que bem entendesse, bastava deixar recado. No mínimo ele deveria...
 - Ah, claro, como não pensei nisso. – Ela deu um peteleco na própria testa e revirou os olhos. – Papai tem alguma reunião em casa. Certo? E deve sr uma bem chata pra eu ter que ir. – Rodolfo concordou com a cabeça.
 Chegando em casa, Rodolfo estacionou o carro e Rafaela foi direto ao escritório de seu pai. Entrou se ao menos bater surpreendendo o pai.
 - Que falta de respeito é essa Rafaela? Bata na porta antes de entrar, e se eu estivesse com alguém importante? – ele falou sério.
 - Tipo quem? O Obama? – Seu pai olhou feio e ela continuou – Pra que esse drama papai, não tem ninguém aqui tem? Não. Porque o senhor pediu para que eu viesse para casa? – ele se sentou na cadeira de frente a ele.
 - Vá se trocar. Contratei novos empregados, irei apresentá-los. – Rafaela fez pouco caso da situação.
 - O senhor me faz vir com urgência para me apresentar empregados. – Ela se levantou e saiu, subiu as escadas em direção ao seu quarto.
 Rafaela ficou horas dentro de seu closet decidindo qual roupa usar, enfim escolheu um short jeans claro e uma camiseta amarela realçando seu cabelo cor de ouro. Ela tomou um banho, passou cremes e perfumes caríssimos, calçou uma sapatilha e desceu.
 Já eram sete horas. Chegando à cozinha a mesa de jantar já estava posta. Estava tudo impecável, ela ficou se perguntando se já era a nova empregada que havia arrumado, mas então ela parou de se perguntar ao ver seu pai. Ela já estava acostumada a ver ele de terno por ser um empresário da alta sociedade, mas ele estava em um de seus mais caros e belos ternos, ela ficou encabulada por ele estar usando-o apenas para uma apresentação de empregados.
 - Você está ótima querida! – ele disse ajeitando sua gravata.
 - E o senhor está... Porque o senhor está de terno? – Ele arregalou os olhos.
 - É uma apresentação Rafaela, eu tenho que parecer sério.
 - O senhor é sério! – Disse Rafaela revirando os olhos e se sentando na cadeira de sempre, à esquerda.
 - Rodolfo? – Chamou Marcos, o pai de Rafaela.
 - Sim. – Disse o mordomo já de pronto ali ao lado.
 - Pode pedir para que venham até a sala de estar, por favor. – Rodolfo concordou e se retirou.
 Rafaela se levantou ao ouvir que seria na sala, e foi andando com a maior falta de paciência, e resmungando que não sabia para que tanta cordialidade. Já fazia tempo que não precisavam trocar de empregados, por seu pai confiar muito na “Zizi” a última empregada, até que ela se mudou para o Maranhão para ficar com sua família. Chegando à sala de estar Rafaela se jogou no sofá, com muita elegância, cruzou suas pernas e ficou olhando para sua unhas perfeitamente pintadas de um vermelho vivo que se destacava em sua pele tão branca. Seu pai sentou-se, também elegantemente, e ficou à espera dos empregados. Rafaela ouviu passos, seu pai se levantou, e então ela abaixou suas mãos e olhou para cima, ficando totalmente surpresa com a cena que via.


CAPÍTULO DOIS
­­­­­­­­­­­­­­­­­­A notícia


 Assim que chegou em casa sua mãe veio rapidamente da pequena cozinha ao seu encontro, com um enorme sorriso em seu rosto.
 - Eu tenho uma ótima notícia! – Assim que eu ela disse isso que Sérgio percebeu o que ela fazia na cozinha, estava empacotando as louças, ele olhou em volta e percebeu que quase tudo estava empacotado. Ele olhou com cara de desentendimento para a mãe que só aumentou o sorriso.
 - Consegui um novo emprego meu filho, um ótimo emprego! Trabalharei em uma mansão como cozinheira, e teremos direito a uma casa, aos fundos da mansão, uma casa tão linda quanto a dos patrões. A casa fica um pouco longe daqui, fica no Lago Sul, mas podemos procurar uma escola lá perto, vai ser ótimo meu filho. – Ela falou tudo tão empolgado que quase tropeçou nas palavras. Sérgio ficou boquiaberto. Não podia ter ouvido uma notícia melhor, morar no Lago Sul seria ótimo, ainda mais agora que ele conseguira a bolsa. Ele sorriu para a mãe, com sus incríveis dentes brancos e perfeitos.
 - Mãe... Que notícia maravilhosa! – Ele a abraçou, pegando-a no colo e a girando. – Eu consegui a bolsa mãe, e morando lá não teremos que arcar nem com a passagem. Sua mãe fez cara de espanto.
 - Não acredito! Parabéns meu filho. - Ela disse chorando – Eu sabia que você conseguiria, sempre me deu tanto orgulho. – Eles continuaram abraçados por um tempo. E então se ouviu uma buzina.
 - É o motorista do chefe, doutor Marcos. Ele veio nos buscar, vamos para lá hoje mesmo, passaremos na escola e pegaremos seus irmãos.
 O motorista desceu e se apresentou como Rodolfo, cumprimentando os dois com grande educação. Ele então os ajudou a colocar as coisas no porta-malas, já que não tinham muito que guardar, somente roupas e as louças. A casa servida aos empregados era mobiliada, com uma mobília quase tão fina quanto à dos patrões. Seguiram até a escola dos outros três irmãos, e na creche para pegarem Denise, de dois anos. Sérgio ficou admirando a paisagem até chegarem na nova casa. Por todo lado que olhava só se via mansões, uma mais linda e maior que a outra. Ainda nem acreditava que moraria ali, por mais que fosse em uma casinha de fundos. Depois de mais ou menos uma hora, chegaram em uma casa enorme pintada numa cor bem clara, algo entre bege e branco, com enormes coqueiros à sua frente e detalhes com vidros no muro, que deixava visível o lindo jardim da casa. No meio do caminha sua mãe contara que o havia oferecido para limpar a piscina, pois estavam precisando disso. Ele concordou feliz.
 O motorista os ajudou a tirar as caixas e levarem para dentro e saiu logo. Sérgio estava com duas grandes caixas, que se livrou logo assim que ouviu a surpresa dos irmãos ao chegarem na sua nova casa. Sérgio também ficou surpreso, ainda estava em dúvida se aquela era a casa dos empregados mesmo. A casa não era pequena, tinha um tamanho normal de uma casa, era pintada em uma cor um pouco mais escura que a da mansão, tinha portas e janelas de madeira e vidro, perfeitamente envernizadas. Sua mãe abriu a porta com lágrimas nos olhos, e então se depararam com uma sala com estofados lindos e novos que combinavam com o leve verde da parede em que se encontrava uma tv de LCD de 32 polegadas, pelo que deduziu Sérgio, e um aparelho de som, e outro de DVD. Havia um balcão com uma pedra de granito, que separava a sala da cozinha, com um jogo de armários branco e bege, com um fogão de quatro bocas, e uma geladeira “frost-free”, com banquetas no balcão para poderem se sentar, seguindo por um pequeno corredor havia três portas com o mesmo verniz da porta de entrada, na primeira porta à direita se encontrava o banheiro, com cerâmicas azuis e brancas, combinando com a pia e o sanitário, com um enorme espelho acima da pia, e com um Box separando o chuveiro. Na segunda porta também à direita havia um quarto com dois beliches perfeitamente arrumados com lençóis beges e uma coberta fina de um amarelo bem claro. O quarto era espaçoso, além dos dois beliches, havia um guarda-roupa de seis portas e um criado mudo, todos pareciam ser feitos de madeira e envernizados, as paredes eram brancas, e a que se encontrava as cabeceiras das camas era bege como os lençóis. Já na terceira porta à esquerda havia outro quarto, este com uma cama de casal e um guarda-roupa também de seis portas, e um criado nas mesmas cores do outro quarto, e no extremo do quarto tinha uma caminha infantil, tudo parecia ter sido projetado para eles. Ele nunca havia tido uma casa tão linda como aquela, sua mãe ainda se encontrava chorando, e seus irmãos já estavam todo colocando suas roupas no armário e escolhendo suas camas. Ele abraçou sua mãe novamente, e  saiu para dar uma olhada. A casa era realmente grande, pois a casa deles não ficava próxima à dos donos dali, havia uma pequena cerca branca separando as casas. O lugar era todo gramado com caminhos em pedras, havia flores por quase todos os lados, um pouco longe dali ele conseguiu ver algo azul, a piscina, deduziu ele. Sua mãe então o tirou de seus devaneios:
 - Sérgio, venha tomar banho e se trocar. Pelo que conversei com o doutor Marcos, haverá uma apresentação, um pouco formal, temos que ficar apresentáveis. - Ele concordou e se dirigiu ao banheiro. Ele vestiu sua melhor camisa, de um azul claro e seu melhor jeans, e calçou seu tênis all star surrado. Sua mãe vestiu um vestido amarelo bem claro, e deixou seus cabelos ondulados soltos. Apesar dos anos passados, sua mãe era muito bonita, seu rosto continuava jovem, quem a via não acreditava que ela tem seus 47 anos. Ela conversou com seus filhos e disse para eles não saírem dali de maneira alguma, o que não foi uma má notícia já que agora tinham uma grande tv para poder assistir o que quisessem. Os dois se dirigiram até a grande casa, entrando pelas portas do fundo como indicado por Rodolfo, lá dentro ela recebia instruções da sua ajudante, mostrando onde tudo estava guardado, até serem chamados por Rodolfo.
 - Dona Carolina, venha comigo. –Ele disse andando pela frente, Sérgio e sua mãe o acompanharam, até chegarem em uma grande sala, com enormes estofados. Encontravam-se duas pessoas na sala, um homem alto de uma pele muito branca com olhos grandes e castanhos, e cabelos pretos, com alguns grisalhos. No sofá ao lado se encontrava uma garota que deveria ser tão alta quanto ele, pois tinha grandes pernas cruzadas; Ela tinha uma pele tão branca quanto o homem, que Sérgio acredita ser o pai, porém tinha grandes olhos verdes e longos cachos loiros... Cabelos cor de ouro e olhos cor de esmeralda. Sérgio então reconheceu a garota que tinha cara de espanto, que mudava o olhar de sua mãe para ele ficando cada vez mais boquiaberta.
 - O que é isso? – Indagou a garota ficando de pé e encarando o pai, que se virou desentendido para ela. – Quem são esses dois, pai? Vai me dizer que... -E então o homem a interrompeu, devia ser o Dr. Marcos.
 - Esses são os novos empregados Rafaela, e desfaça essa cara de espanto! – ele disse rigidamente. A garota se calou, mas ainda tinha o olhar indignado.
 - Bom, eu sou Marcos, o novo... Chefe de vocês, prazer. – Ele disse e se dirigiu a Sérgio e Carolina com apertos de mão. – Essa é minha filha Rafaela – Ele disse apontando para a garota com cabelo cor de ouro.  – Bom, então Carolina, você ficará encarregada da nossa alimentação – ele deu um leve sorriso – E você Sérgio, meu rapaz, ficará encarregado da limpeza da piscina. – Enquanto ele dizia isso a garota, Rafaela, estava se retirando da sala, e então seu pai se virou. – O que pensa que está fazendo Rafaela? – Ela parou, suspirou e virou-se.
 - Por favor, isso é patético. - Ela revirou os olhos, e cruzou os braços. – O senhor faz toda essa cordialidade, para apresentar isso. – Ela apontou com cara de nojo na direção de Sérgio e Carolina. Nesse momento o sangue de Sérgio ferveu, e ele quase cometera uma burrice, mas se lembrou do conforto que teriam ali, e ignorou a patricinha.
 Seu pai foi até ela, segurou seu braço e murmurou algo, a garota levantou os olhos para o rosto de seu pai, bufou e voltou a se sentar no sofá com desleixo e elegância.
 - Peço desculpas! – Disse Marcos. – Bom, por ser o primeiro jantar, peço a vocês que nos acompanhem, já que Rafaela e eu jantamos a sós todas as noites. – A garota ficou boquiaberta novamente, mas não disse nada.
 Eles se dirigiram à sala de jantar. Havia uma mesa de quatro cadeiras, devido a morar apenas Rafaela e seu pai naquela casa. Marcos e Rafaela se sentaram à esquerda. Carolina se sentou de frente a Marcos o que fez com que Sérgio sentasse de frente com a pessoa que ele mais odiava, a partir de hoje. Ele olhou para ela que retribuiu o olhar enfurecido. O jantar foi servido.
 O jantar foi em total clima de tensão de ambos os lados. Rafaela não tocou na comida, deixando seu pai aborrecido. Carolina não se sentiu nem um pouco à vontade com o comportamento da garota e de Sérgio, de vez em quando dava umas olhadas sérias para ele, que tentava evitar. Marcos se desculpou e desejou boa noite aos dois, já Rafaela subiu bufando para o quarto assim que se retiraram da mesa de jantar, recebendo mais um olhar raivoso de seu pai.
 - Só o que faltava agora! – Esbravejou Rafaela em seu quarto. – Já não bastava pensar em ter aquele nojento na escola ele vai morar aqui! Urgh!
 A noite foi turbulenta tanto para Rafaela quanto para Sérgio que chegou em casa e passou direto para o quarto, onde seus irmãos já haviam adormecido. Ele não conseguiu dormir direito tendo sonhos estranhos a todo o momento.

CAPÍTULO TRÊS
Terceiro “A”

 Rafaela acordou mais espantada que o normal assim que o despertador tocou, às 6 horas. Ela mal havia pregado o olho no sábado e nem no domingo. Ela foi até o banheiro e ficou horrorizada com que via no espelho. Ela tinha grandes olheiras a deixando com um aspecto horrível devido sua pele de cor muito branca.
 - AH! O que eu vou fazer? Não posso chegar na escola, no primeiro dia, com essa cara de noiva cadáver! – Ela tomou um banho rápido, vestiu seu uniforme, uma cala azul marinho com listras laterais vermelhas e uma blusa com o mesmo tom das listras com gola “v”. Colocou duas bolsas de água gelada nos olhos e desceu as escadas meio às cegas. Seu pai já estava sentado na mesa com um jornal à sua frente e uma xícara de café em uma das mãos. Ela se acomodou no lugar de sempre e reparou que a mesa estava perfeitamente colocada, havia os pães franceses, um bolo de laranja, suco natural de maracujá, leite, café, torradas integrais e algumas frutas. Ela se serviu tentando ignorar ao máximo a presença de seu pai.
 - Eu estou me perguntando o “porque” do seu comportamento na noite de sábado até agora. – Disse seu pai abaixando o jornal com um olhar sério e lábios rígidos. Ela revirou os olhos e suspirou.
 - Será que dá pra não me lembrar daquela noite?- Ela mordeu sua torrada integral com requeijão light.
 - Sim. Podemos, mas não quero que isso volte a acontecer Rafaela, você sempre foi uma garota educada, continue sendo, por favor.
 E essa foi toda a conversa matinal dos dois. Já na casa ao lado, Sérgio vestia o novo uniforme ganho por ter conseguido a bolsa totalmente integral. Calçou seu tênis mais novo, que era usado somente em ocasiões especiais e foi tomar o seu café, já preparado pela mãe antes de sair. Seus irmãos já estavam todos de pé com os novos uniformes da escola pública mais próxima, na qual Carolina os matriculara, e tomavam leite com achocolatado e pão com manteiga. Denise, de apenas dois anos ainda estava dormindo na cama da mãe. Sérgio olhou no relógio e viu que já eram seis e quarenta e cinco, pegou seus materiais, e levou seus irmãos até o ponto para pegarem o ônibus e deixou Denise, ainda desacordada, na creche, que por sorte abria às seis. E então foi caminhando até sua nova escola.
 Malu não parava de olhar no relógio caríssimo e para a rua procurando avistar o hyunday da sua amiga. Já eram sete horas e nada de Rafaela, ela já estava ficando preocupada a única com quem conversava era ela, se ela faltasse estaria totalmente só, ela foi pega de surpresa quando viu a amiga parada em sua frente com fones de ouvido na mão e cara de estresse.
 - Rafaela! Pensei que não viria. – Ela abraçou fortemente. – Vem, estamos atrasadas, nem sei qual é nossa sala ainda. Você não foi para o clube ontem, o que houve? E que cara é essa? – Rafaela revirou os olhos.
 - Depois te conto tudo. E, calma meu amor, hoje é o primeiro dia, todo mundo deve estar olhando as turmas. – Elas se dirigiram até a secretaria, observando no mural procurando seus nomes nas listas do terceiro ano. Elas estavam na mesma turma novamente, no terceiro “A”. Elas se viraram e se chocaram com um garoto alto e moreno que quase derrubou a magra Rafaela, mas ele e segurou antes do tombo. Rafaela ergueu os olhos e viu os olhos mais lindos de sua vida. Eram tão azuis tão azuis que ela não sabia descrever, ela ficou hipnotizada por alguns segundo, o garoto a ergueu.
  - Desculpe! Bem, eu sou Rafael Montenegro, prazer. – Ele ergueu a mão.
 - Não tem problema. Que coincidência! Meu nome é Rafaela. Rafaela Barcelos. – Ela apertou a mão dele e sorriu, absorta naqueles lindos olhos azuis.
 Eles seguiram para a sala, que para infelicidade de Rafaela não era a mesma, ela se sentou logo na primeira cadeira, retirando seus livros, o professor começara a aula. Passados cinco minutos da aula, os quais ela passara pensando em Rafael, bateram na porta, três batidinhas. O professor, Luís, a abriu e Rafaela viu o que menos desejaria em plena manhã de segunda feira. Sérgio.
 - Ah não! – Ela bufou. Ele olhou para ela e também ficou indignado. Como em tantas escolas, tantas salas ele caíra na mesma da garota que ele mais odeia. Ele suspirou e seguiu para a última cadeira que restara, ao lado esquerdo da sala, de onde tinha uma visão perfeita de Rafaela.
 As três primeiras aulas passaram lentamente, Sérgio ficou encantado. As aulas eram ótimas, os alunos não conversavam, diferentes da sua antiga escola onde ele não conseguia ouvir o professor direito, e os professores eram maravilhosos. Ele percebeu também, que a garota dos cachos loiros prestava total atenção na aula. Assim que tocou o sinal da última aula, ele estava saindo da sala quando sem querer esbarrou nela, que guardava seus livros, a garota, com seu pouco peso caiu no chão. Havia outra garota sentada na cadeira ao lado, uma baixinha de cabelos pretos e pele bem branca em contraste com seus olhos tão pretos quanto o cabelo, ela abriu a boca em um perfeito “o” quando viu a loira estirada no chão.
 Rafaela se levantou em um impulso e empurrou o garoto com a maior força que pôde.
 - O que é garoto? Virou moda agora me derrubar no chão? Seu ogro. Nojento. – Ela dava fortes tapas no garoto quando ele segurou seus pulsos com força, o ódio pulsando em suas palavras.
 - Qual é o seu problema? Será que não podem acontecer incidentes mais? – Ela deu um sorriso irônico. – E não faça essa cara. Aguada. – Ela ficou mais indignada ainda.
 - Me larga seu ridículo! – Ele a soltou, fez um movimento de negação com a cabeça e saiu da sala. – AH!- Ela gritou. - Que droga, porque isso só acontece comigo! O que eu fiz de errado? – Maria Luiza recolheu o material da amiga e colocou na mochila.
 - Ra-fa-ela! – Ela soletrou. – O que eu fiz de errado que só você esbarra nos garotos lindos.
 - O que? Ta falando de que Maria Luíza. – ela colocou a mochila nas costas e foi a caminho da saída.
 - Ora de que. Primeiro o Deus grego do clube esbarra com você no corredor, depois o outro Deus grego esbarra em você na saída da aula. – Ela falava com devoção.
 - Deus grego? Só se for da favela né. – Ela entrou em seu carro e Maria Luíza no seu.


CAPÍTULO QUATRO
O sonho

 A semana passou rapidamente para a surpresa de Sérgio. A partir daquele dia ele passou a esperar a loira sair da sala para depois se retirar para não correr o risco de esbarrar com ela mais uma vez. Passou a acordar mais cedo para não se atrasar. Ele tinha que limpar a piscina três vezes por semana, e teve que limpá-la no sábado, pois seria usada. Ele acordou às sete horas para não correr o risco de pegarem a piscina “suja”. Ele estava entretido retirando algumas folhas quando viu um corpo esguio e branco se aproximando com roupa de banho. Ele ergueu os olhos assustados e se deparou com Rafaela com um biquíni vermelho vivo, da cor de sua unha. Ela baixou as lentes escuras de seus olhos, olhou para ele e sacudiu a cabeça em negação.
 - Ta fazendo o que aqui? Não disse que a piscina seria usada hoje? Isso significa sem funcionários. – Ela enfatizou o “sem”. Ele ia responder quando lembrou que ali ele era o funcionário dela, era duro, mas era a verdade.
 - Desculpe senhorita! – Ele disse com cordialidade. – Já terminei meu trabalho. – Ela deu um leve sorriso, mas fechou a cara rapidamente.
 - Então some. – E se sentou na cadeira à beira da piscina. – Ele se retirou cordialmente, guardou seu instrumento de trabalho na “casinha da piscina”, e foi para casa.
Ele fez todos os deveres de casa, que não eram muitos por ser a primeira semana de aula, e foi assistir televisão. Seus irmãos tinham ido para a casa de sua tia, do outro lado da cidade, e sua mãe estava na casa ao lado fazendo a comida da megera.  Ele assistiu um pouco sobre um programa de esporte, mas logo dormiu. Ele acordou nove horas, um pouco espantado, mas continuou deitado, porém desligou a TV. Ele havia sonhado, um sonho estranho. Ele estava caído, sentia muita dor de cabeça, sentia um forte cheiro de sangue e ouvia o som de sirenes, era muito difícil abrir os olhos, depois de muito esforço ele conseguiu. Só tinha uma pessoa na sua frente, uma garota com longos cachos loiros, cor-de-ouro, e pele muito branca com olhos tão verdes quanto esmeralda, cheios de lágrimas o rosto molhado. Era Rafaela, e chorava sob seu corpo dolorido. E então ele acordou. Ele se xingou mentalmente por ter sonhado com ela, mas apesar de odiá-la, ele não podia negar, a garota era linda. Tinha a pele tão branca quanto neve, os cabelos tão loiros, pareciam ouro, e seus olhos eram verdes como esmeralda, ela era alta e esguia, parecia ser modelo ou algo do tipo, e seu sorriso, que ele tinha visto pela primeira vez há pouco tempo, era exposto por dentes perfeitamente brancos e alinhados, sua pele parecia ser macia, dava vontade de tocar. Não, claro que não. Tocar em alguém como ela, nunca.

Rafaela passou protetor solar por todo seu corpo à espera de Malu, que como sempre estava atrasada. Ela deitou-se e ligou seu mp3. Depois de três músicas Maria Luíza chegou.
 - Olá Rafa! Desculpe o atraso, é que acordei um pouco fora da hora. – Ela sorriu sem graça.
 - Tudo bem. Cadê seu biquíni? Vá se trocar porque estou doida para dar u mergulho, só na entrei ainda por sua causa. – Ela recolocou eu óculos.
 -Estão aqui, já vim vestida. – Ela tirou seu vestido e revelou uma pele tão branca quanto à de Rafaela, mas aparentando ser mais branco pelo contraste com seu cabelo preto. Ela usava um biquíni preto. – Vamos? – Ela se posicionou na beira da piscina. Rafaela se levantou em um pulo e se posicionou ao seu lado. Elas contaram até três e deram dois mergulhos perfeitos. Faziam natação há muito tempo. Era uma das muitas aulas que Rafaela tinha, junto à de piano, inglês, francês, hipismo, vôlei e curso preparatório, este na própria escola. Elas passaram toda a manhã na piscina saindo por alguns momentos e comendo alguns petiscos deixados para elas. Ao meio dia elas se retiram, secando-se nas toalhas e indo para quarto de Rafaela. Maria Luíza subiu para o quarto enquanto Rafaela foi à cozinha escolher o que fariam para o almoço. Ela disse tudo à Lúcia, ajudante de Carolina por não querer falar diretamente com ela, foi para o seu quarto tomar um banho. Malu já se trocara e penteava seu cabelo curto e negro. Rafaela escolheu sua roupa e tomou seu banho, as duas desceram as escadas ambas com enorme sorriso no rosto. Malu lembrou de ter deixado sua bolsa na mesa ao lado da piscina e foi buscar enquanto Rafaela ligava para seu pai. Ela foi andando tranqüilamente até que viu alguém sentado no banquinho de madeira “perto” da piscina, ela curiosamente continuou andando até o garoto se virar, e então ela percebeu que era o garoto com quem Rafaela esbarrara. Ela sorriu gentilmente e ele retribuiu; ele tinha um sorriso lindo. Ela sentou ao lado dele e perguntou:
 - O que você faz aqui? – Não tirando os olhos dele por nenhum segundo.
 - Bem, é que... Eu não deveria estar aqui, mas não tinha ninguém aqui então não vi problema. – Ela fez cara de desentendida e ele explicou. – Eu trabalho aqui, bem, minha mãe trabalha aqui. Eu só limpo a piscina.
 - Ah! – ela sorriu. – Bem, eu sou Maria Luíza, mas pode me chamar de Malu. –Ela estendeu a mão e lê a apertou – Prazer, sou amiga da Rafaela, a dona da casa.
 - Eu sou Sérgio. Da Rafaela? – Ele disse meio indignado. – Mas você é tão simpática e educada, como pode ser amiga dela? – Malu sorriu.
 - Ela não é má pessoa! Mas obrigada pelo elogio.
 - MARIA LUÍZA! – Alguém gritou.
 - Ops. Tenho que ir. Tchau. – ela deu um beijo na bochecha dele e sumiu. Ele sorriu para si mesmo.


CAPÍTULO CINCO
Desentendimentos
 - Bom, no teste de amanhã vocês terão que desenhar toda a tabela periódica. A nota máxima será 1,0. E, por hoje é só, vocês estão liberados.
 Os alunos arrumaram seus materiais apressados ansiosos para sair da sala depois de muitos cálculos. Rafaela já estava no corredor quando deu por falta de Malu, ela voltou dois passos e se inclinou de modo a ver a sala, ela viu que a amiga estava concentrada conversando com Sérgio, ela ficou boquiaberta e gritou a morena.
 - Maria Luíza! – A garota a olhou assustada, e Sérgio fechou a cara no mesmo instante que viu de quem era a voz.
 - Nossa Rafaela, que gritaria! – Ela franziu a sobrancelha. – Só estou conversando com o Sérgio. – Ela sorriu para o garoto. Rafaela entrou na sala, colocou as mãos na cintura e ficou encarando os dois.
 - Ah, agora é casalzinho é? – Ela disse ironicamente. – Olha, estou indo embora, não tenho estômago para isso. – Ela se virou balançando os cachos loiros. Sérgio a olhou sair e então se virou para Malu.
 - Como você agüenta ela? – A morena sorriu.
 - Ela é boa pessoa Sérgio, é porque você não a conhece direito. – Ela estava séria igualmente a Sérgio.
 - Não, não acredito que ela seja! E eu tenho certeza que ela me trata assim por eu ser negro. – Malu engoliu seco.
 - Claro que não, que bobeira! – Ela sorriu desajeitada, e tentou mudar de assunto. – Mas então, como você foi parar na casa da Rafaela?
 - Ah! Bem, minha mãe conseguiu o emprego de doméstica lá, e fiquei com o de limpar a piscina, e como eles concedem casa aos empregados... – Ela concordou com a cabeça.
 - Mas se você vem de família humilde... – Ele a interrompeu já adivinhando a pergunta.
 - Consegui uma bolsa. – Eles já estavam no portão da escola e o carro de Malu já chegara.
 - Ah sim. Bom, nos vemos depois, tchau. – Ela lhe deu um beijo na bochecha e ele seguiu seu caminho até em casa tranqüilamente.
 Chegando em casa ele deu de cara com Rafaela sentada em um banco perto de “sua” casa. A garota já trocara o uniforme e vestia uma saia azul clara com pregas e uma camiseta pólo, tênis branco e o cabelo preso em um rabo alto. Ela se levantou e o encarou assim que percebeu sua presença.
 - Família grande. – Ela disse em um tom calmo. Ele estava sem entender o porque dela estar ali, na área dos empregados falando com ele. – Mas eles não parecem ser da sua família. – ele entendia o porque, eram todos brancos.
 - O que você está fazendo aqui? – Ele perguntou em um tom mais calmo que pôde.
 - Não posso andar pela minha propriedade? - Ela apontou pra si.
 - Claro que pode senhorita, o problema é que pensei que não gostasse de se misturar aos empregados.
 - É, pensou certo. Não gosto. E é por isso que vim aqui falar com você. O que é que está rolando entre você e a Maria Luíza? – Ele percebeu o tom autoritário dela e sorriu.
 - O que está rolando entre mim e a Maria Luíza diz respeito a mim e à Maria Luíza. – Ele fechou a cara, e a garota se contorceu de raiva.
 - Ah seu... Olha aqui, vê como você fala comigo! E a Maria Luíza é areia demais pro seu caminhãozinho ta?! Larga do pé dela. – Ela disse e saiu em direção a casa dela. Sérgio se pôs a sorrir com a cara de pau da garota, que queria cuidar até da vida da amiga, que por sua vez era muito diferente dela, e Sérgio gostara dela.
 Ele lavou a louça do almoço e foi fazer seus deveres, a piscina já estava impecavelmente limpa, e ele tinha de decorar toda a tabela periódica, mas não conseguia tirar a imagem da arrogante Rafaela de sua cabeça.
 - Oi Sérgio! – disse uma voz suave, Laísa. – Você estuda no mesmo colégio que a garota bonita? – ela estava com cara de empolgação.
 - Que garota bonita?
 - A filha do dono da casa, Rafaela, acho. – Ela se sentou ao seu lado no balcão da cozinha ajeitando seu cabelo preto e liso em um rabo de cavalo. Ele sorriu indignado.
 - Porque o interesse? – ele guardou os cadernos.
 - Bom, achei ela tão simpática. Ela veio aqui procurando você hoje mais cedo. – ela sorriu timidamente – ela disse que tenho o cabelo lindo. – Ela acariciou o formoso rabo de cavalo.
 - Nisso ela estava certa, seu cabelo é lindo. Mas não acho que ela seja simpática. Sou o único que percebe isso? – Ele levantou e se sentou no sofá. Laísa o acompanhou não ligando pro que ele disse.
 - Mas o cabelo dela é bem mais bonito que o meu. Você viu? Parece ser feito de ouro, e tem cachos perfeitos, e ela disse que é natural, não usa babyliss. – Ela fez cara de sonhadora.
 - Vocês conversaram por muito tempo?
 - Só um pouco, mas ela disse que gostou de mim e que depois vem me ver de novo. E eu não sei porque você não gostou dela.
 - Ela não gostou de mim! – ele praticamente berrou. – Me tratou com total diferença por eu ser negro Laísa, agora me diz, você acha isso certo? – A garota arregalou os olhos e abriu a boca pra responder, mas o irmão a interrompeu. – E você não deveria falar com ela, senão ela vai acabar fazendo sua cabeça também. – Laísa ficou boquiaberta e se levantou já com as bochechas vermelhas de raiva.
 - Você ta insinuando que eu vou te tratar diferente porque ela te trata diferente? Ah tenha dó Sérgio! E para de fazer drama, quem garante que ela te tratou assim pela sua cor? Ela pode muito bem não ter gostado de você, e eu não vou perder a chance de ter uma amiga como ela por sua causa. E vê se me deixa. – Ela saiu furiosa pra o quarto.
 Sérgio ficou assustado com a reação da irmã. Até que ela podia estar certa, talvez a garota não o odiara por sua cor, mas... Não, não tinha jeito, ela o odiara por isso, não tem outra razão. Ele ficou pensando o porque dela ser assim já que o pai dela sempre fora tão educado com ele e sua mãe. Os tratavam como se nem fossem empregados, como se fossem conhecidos da família. Mas o vento ainda ia virar, aquela garota ia aprender a não ser tão superior aos outros por preconceito.

 - Hoje não teve graça alguma o tênis. – Rafaela estava dentro do carro com Rodolfo a levando para casa. – Não sabem nem escolher adversários, quer dizer, ou aquela garota era iniciante ou era muito ruim. Estou tão cansada, e ainda tenho deveres para fazer e uma tabela periódica pra decorar.
 Assim que chegou em casa Rafaela tomou um banho e colocou um vestido bem leve. Desceu até a cozinha e tomou uma vitamina que pedira para fazerem, e retornou ao seu quarto no intuito de estudar. As sete e meia, como de costume seu pai já a esperava para o jantar.
 - Como está indo na escola filha? – Ele pôs se a mastigar educadamente.
 - Bem. O ano está começando agora, portanto as coisas ainda estão fáceis. Estava estudando física agora a pouco. – Ela começou a mastigar também.
 - Sabe que esse ano tem que estudar muito não é mesmo? Terceiro ano, final do ano tem vestibular, as notas finais do Paes, o Enem... – Ela concordou.
 - Eu nunca deixei de me dedicar papai, não vai ser agora que vou fraquejar. – Ele concordou.
 O resto do jantar foi silencioso. Rafaela terminou sua sobremesa e pediu licença ao pai voltando ao seu quarto para estudar novamente. Ela pretendia estudar até a hora de dormir, então escovou os dentes e vestiu seu pijama antes de se sentar para ler. Sua vista estava embaçada e as letras todas embaralhadas ela olhou no relógio e viu que já eram onze horas da noite, para ela que se acostumara a dormir as oito e meia, nove horas aquilo passara do limite. Ela guardou o caderno e os livro olhando para o horário não decorado e foi se deitar dormindo segundos depois.
 O relógio despertou às seis horas, Rafaela tomou banho e vestiu seu uniforme, hoje usava um short por não estar fazendo frio. Como de costume seu pai a esperava, ela comeu uma torrada com geléia, leite de soja e saiu rumo à escola. Quando fechava a porta viu Laísa, um garoto muito parecido com ela, e Sérgio, segurando um bebê muito lindo no colo.
 - Bom dia Laísa! – ela disse com sinceridade, tinha se afeiçoado pela garota. – Ela ignorou o rapaz ao lado dela e cumprimentou a garota com um leve beijo na bochecha.
 - Bom dia Rafaela! – Laísa olhou de cara feia para o irmão, Sérgio.
 - Escuta, hoje eu não tenho nada para fazer a tarde, porque não vai lá em casa...?
 - Nós temos que ir! – Sérgio a interrompeu. Ela levantou os olhos pela primeira vez para o garoto, que a deixou mais uma vez enfurecida. Ela baixou os olhos para Laísa.
 - Não se esqueça, passa lá. – Laísa concordou com a cabeça e foi embora junto com seus irmãos. Rafaela se direcionou a garagem enquanto Rodolfo terminava de lustrar o volante. Ele era apaixonado por carros, e tinha muito orgulho em poder dirigir o carro da “família”, porque somente Rafaela o utilizava.
 - Não sei porque tanto limpa isso aí, vai ficar cheio de impressões agorinha! – Ela se sentou no banco de trás e mexia em seu cabelo enquanto se olhava no retrovisor. Ela estava com o cabelo solto, pairando até a cintura em longos cachos dourados.
 Seguiram para a escola, onde Rafaela se encontrou com Malu, que sentou ao lado de Sérgio na sala de aula, arrancando olhares faiscantes da moça. Rafaela deixou a amiga de lado e se concentrou na aula. No penúltimo tempo chegara a hora da prova de física. Ela conseguira responder todas as perguntas, sem dúvida em nenhuma, ficou orgulhosa de si mesma, ela se virou para o lado para comentar sobre a prova com a amiga, assim que foram recolhidas, e se deparou com um garoto. Esquecera que Malu estava lá atrás ao lado do “chato”. Assim que o sinal tocou, ela juntou suas coisas e saiu da sala sem ao menos olhar pra trás, Malu a puxou pelo braço e ela virou explodindo.
 - Nem adianta vir falar comigo... – Ela se calou e viu que não era Malu, e sim o garoto d olhos azuis que vira na semana passada, Rafael. – Ah, desculpa. Oi Rafael. – Ela sorriu, sentindo as bochechas corarem.
 -Oi! – Ele sorriu sem graça também. – Bem, eu que devo desculpas, não devia ter te puxado assim, mas por curiosidade, quem pensou que era?
 - A Maria Luíza; Mas não quero falar sobre ela. E então, como você ta? – Eles começaram a caminhar em direção a saída.
 - Estou muito bem, e você?
 - Indo. – Ela olhou para trás na esperança de ver Malu. Não queria vê-la, mas ao mesmo tempo queria, queria poder dizer umas poucas e boas, mas seus pensamentos foram interrompidos por Rafael.
 - Quer sair comigo qualquer dia desses? – Ela fora surpreendida. Sempre fora uma garota popular, ninguém tinha dúvidas sobre isso, mas era também autoritária, não eram muitos os garotos que a convidavam, e eram muito poucos os que ela topava sair. Ela sorriu.
 - Pode ser... – Ela queria se fazer de difícil, mas era complicado diante daqueles olhos azuis.
 - Então... Que tal, na sexta feira da semana que vem? – Ele fez cara de dúvida o que fez ela sorrir novamente.
 - Certo. Mas, para onde vamos? – Ela parou na escada da saída da escola.
 - Jantar, em um restaurante maravilhoso, tudo bem pra você? – Ela pensou um pouco.
 - Combinado então. As seis e meia. Ok?
 - Ok. – Ela se despediu e seguiu para o carro que já a esperava.

 - Tem certeza que não quer carona? – Perguntou Maria Luíza pela quinta vez.
 - Tenho Malu. A casa não é muito longe daqui, você sabe. – Eles estavam parados ao lado do carro dela na porta da escola.
 - Pelo visto a Rafaela já começou a usar o charme dela. – Sérgio olhou para a mesma direção que Malu olhava e viu Rafaela conversando com um garoto alto e magricela. Ele tornou a olhar para Malu.
 - Acho que já vou.
 - Não! – A garota soltou rápido desvencilhando o olhar da amiga. – Quer dizer... Já? – Ela olhou em seu relógio cravejado de pedras e viu que já se passava de uma hora. Ele concordou com a cabeça e lhe deu um beijo na testa.
 - Te vejo amanhã. – Ele disse para a garota que tinha um enorme sorriso no rosto.
 - Escuta... – Ela disse segurando-o pelo braço. – O que acha da gente ir jantar? – Ele sorriu, mas logo ficou sério e baixou os olhos.
 - Não sei se vai dar, o dinheiro que vou receber esse mês... – Ela o interrompeu
 - Ah tenha dó Sérgio! Foi-se o tempo em que o homem pagava a conta, é algo bem cavalheiresco, mas não precisa. Eu pago, certo?
 - De jeito nenhum.
 - Então você paga o seu, e eu pago o meu.
 - Tá. Quando? E aonde?
 - Em um lugar que adoro. Faz assim, eu passo na sua casa, com meu motorista, e de lá nós vamos. – Ele concordou e se despediu novamente.


CAPÍTULO SEIS
Tarde divertida

- Oi! – Disse Rafaela toda entusiasmada quando a nova amiga chegou, Laísa. –Vem, vamos ali pedir um suco, daí subimos para o meu quarto. – A garotinha concordou e elas seguiram em direção à cozinha.
 - Carolina? – Laísa estava admirando o tamanho e a beleza da casa, quando ouviu Rafaela chamar sua mãe e ela aparecer.
 - Sim senhorita... – A mulher ficou pasma ao ver a filha ali, que ficou vermelha com o olhar da mãe. Rafaela notou e foi ao socorro da amiga.
 - Acho que não se importa de eu convidar sua filha para passar a tarde comigo Carolina? – A mulher sacudiu a cabeça em negação, com um rosto mais aliviado.
 - Não dona Rafaela.
 - Então certo. Eu quero um suco de laranja bem forte e... – Ela olhou para Laísa em duvida.
 - Uva, suco de uva. – Ela sorriu sem graça por ver que a mãe teria que preparar o suco dela.
 - Então um suco de uva e um de laranja Carolina. – Ela pegou a garota pela mão e a puxou em direção ao seu quarto, Laísa estava empolgada, ficara imaginando como seria o quarto de Rafaela. Elas subiram as escadas e pararam em um corredor com seis portas, três de cada lado. Rafaela a puxou até a primeira do lado direito e abriu a enorme porta. Laísa ficou boquiaberta.
 O quarto era bem grande, e espaçoso, no centro tinha uma cama bem grande com vários travesseiros e uma colcha com flores amarelas sobrepondo um lençol também amarelo, as cortinas combinavam com a colcha. As paredes eram brancas com exceção de uma que era lilás. Por mais que jamais pensasse em combinar as duas cores, Laísa gostou da decoração, de um lado tinha uma escrivaninha com um laptop e um som, no outro extremo, grandes portas brancas e na parede de frente a cama tinha uma grande TV LCD. Junto à escrivaninha tinha uma cadeira acolchoada com a mesma estampa da colcha. Rafaela se sentou e um grande pufe amarelo pegando um controle.
 - De que tipo de música você gosta Lah? – Laísa sorriu com a intimidade de Rafaela. Ela olhou em volta procurando um lugar para poder se sentar, quando viu Rafaela dar palmadinha em um pufe lilás ao seu lado, para que ela se sentasse. Ela sentou e pensou que música gostava.
 - Bem... Gosto de muitas músicas. – Rafaela apontou o controle para a tv e ligou.
 - Mudando de planos... Vamos assistir clipes. – Ela começou a passar canais rapidamente, até parar em um que passava um clipe do Black Eyed Peas. – Gosta? De Black Eyed Peas? – Ela olhou para Laísa.
 - Gosto. Mas acho que prefiro Beyoncé. – Rafaela sorriu.
 - Eu também. – Ela abriu um tipo de menu mexendo com o controle e clicou no nome “Beyoncé”. Apareceram nomes de vários clipes que Laísa conhecia muito bem, Rafaela clicou em um dos clipes preferidos de Laísa, “Crazy in Love”, e deu pausa. – O que acha de dançarmos? – Laísa concordou com um sorriso, ela amava fazer isso. Elas afastaram os pufes e tiraram o tapete fofo que tinha ali, e então Rafaela deu play.
 Laísa ficou encantada, Rafaela sabia toda a coreografia e a dançava perfeitamente. Crazy in love, Single Ladies, Check on it, Sweet Dreams, Naughty Girl, Get me Bonied, Beautiful Liar, Vídeo Phone, todas Rafaela conhecia a coreografia e dançava igual a própria Beyoncé. Mas ela não deixou Laísa de fora, repetiu as músicas sempre que Laísa errava algum passo, ensinando-a. Depois de tantas músicas as duas estavam bem cansadas. Elas caíram exaustas nos pufes. Rafaela olhou no relógio, ainda era duas e meia.
 - O que acha de tomar um banho de piscina? – Ela perguntou a Laísa, que olhou para ela sorrindo.
 - Piscina? Sério? – Ela sempre amara banhar de piscina, mas não costumava ir aos clubes pela falta de dinheiro da família.
 - Claro que sim! Vai até sua casa e pegue um biquíni, enquanto isso eu visto meu. – Ela concordou se levantando. – Nos encontramos lá na piscina.
 Rafaela estava se sentindo muito suada, então tomou uma chuveirada rápida e vestiu um biquíni preto com bolinhas azuis. Colocou um lenço azul como saia e desceu as escadas. Foi até a cozinha e chamou Carolina.
 - Prepara uns petiscos e cremes e leva lá na piscina, o meu é de maracujá, o da Laísa não sei, mas você deve saber. – E foi em direção a piscina.
 Ela chegou junto com Laísa, que vestia um biquíni rosa que combinava com a cor de sua bochecha. Rafaela tirou o lenço.
 - Sabe nadar? – Ela olhou para Laísa, que concordou com a cabeça. O irmão a ensinou em um rio próximo a sua casa. – Então vamos apostar uma corrida. Elas se posicionaram na ponta da piscina e contaram até três. Sem surpresa, a vencedora foi Rafaela, até mesmo por ser bem maior que Laísa, e por nadar desde os cinco anos. Elas competiram no nado, nos saltos, nas “bombinhas”, “barrigadas”, Laísa vencera quase todas, depois elas saíram para lanchar; ambas estavam famintas. Elas se deliciavam quando Sérgio chegou.
 - Laísa o que está fazendo aqui? – Ele olhou assustado para a irmã e depois para Rafaela, que se levantou.
 - Ela está me visitando, algum problema? – Ele ficou em dúvida.
 - Porque você a convidaria para te visitar? – Ele cruzou os braços, e a garota jogou seus cabelos para trás.
 - Porque ela é uma pessoa adorável. Diferente do ogro que ela tem como irmão. – Ela sorriu sarcasticamente.
 - Ah. – Ele soltou os braços.
 - Gostaria que você se retirasse, pois a diversão é só entre eu e ela, some daqui.
 - Não, eu vim buscar ela. – Ele acenou pra Laísa que revirou os olhos já se levantando. Rafaela a sentou.
 - Porque? – Ela olhou com desconfiança ro rapaz.
 - Está na hora dela fazer o dever de casa, e ajudar o irmão dela com o trabalho deles, que ele está fazendo sozinho. – Rafaela olhou para Laísa, que sorriu sem graça e concordou com a cabeça, ela sempre fora rígida com deveres de casa, sempre foi uma ótima aluna, portanto queria que a garota fizesse o mesmo.
 - Tudo bem, então. Depois agente se vê de novo Lah. – Ela deu um abraço na garota.
 - Obrigado por tudo Rafaela, a tarde foi muito divertida, muito obrigado.
 - Não precisa agradecer, mas prometa que repetiremos...
 - Claro! – Laísa estava muito entusiasmada, enquanto o irmão olhava tudo aquilo como se fosse um teatro de Rafaela, o que lhe causou mais repugnância da garota.
 Rafaela olhou feio para Sérgio mais uma vez antes de se levantar e ir para casa, enquanto Sérgio a encarou.

CAPÍTULO SETE
O trabalho

 - Bom, turma, vocês estão já no terceiro ano do ensino médio, e já tem suas responsabilidades, assim como muitos não têm nenhuma. Nós professores tivemos uma reunião e decidimos passar um trabalho um pouco diferente, já adotados em algumas escolas do exterior. Juntamente com um abrigo de cães, realizaremos um trabalho sobre a gravidez na adolescência, e então vocês perguntam: “Mas o que tem a ver os cachorros?”, os cachorros serão todos filhotes, e vocês terão a tarefa de cuidar deles durante este semestre, como se fossem filhos, por sorte a nossa turma tem exatamente dez homens e dez mulheres, eu irei selecionar as duplas que no final farão uma redação valendo a nota total, com isso não terão prova. Ontem duas cadelas deram à luz a oito cachorrinhos, os outros já têm seis dias, mas não faz muita diferença. Peço que fiquem em silêncio enquanto seleciono as duplas. – A turma continuou em silêncio como pediu a professora, mas ambos com cara de expectativa e desgosto, por não poderem escolher seus pares. Rafaela fazia incessantes anotações em sua agenda enquanto Sérgio e Malu estavam em uma conversa cochichada. Dez minutos depois a professora se levantou.
 - Já estou com os pares aqui – Ela levantou o caderno – E não quero ouvir reclamações, vocês serão como um casal, serão como pais para esta criança, portanto conviverão bastante durante esses seis meses, quero que anotem tudo, os dois, cada um em seu caderno, as discussões entre vocês e o desempenho do cachorro. Amanhã serão dispensados mais cedo da aula para que vocês vão até o canil indicado pegar o filhote. Portanto, aqui estão os casais: Alice e Marcelo, Camila e João, Davi e Juliana, Maria Luíza e Nathan – Malu sibilou algo com cara feia – Marcos e Daniella, Bruna e Wesley, César e Vitória, Lucas e Beatrice, Rayane e Otávio, Sérgio e Rafaela.
 - O que? – Gritaram Sérgio e Rafaela em uníssono. Um olhou para o outro e depois de volta para a professora, que os olhou calmamente sobre as lentes de seus óculos.
 - O que eu disse sobre objeções mocinhos? Nem adiantam reclamar, já está decidido. – Os dois se olharam novamente enfurecidos e sentaram-se bruscamente.
 Assim que tocou o sinal os alunos já haviam pegado fichas com a identificação deles e da dupla. Sérgio não queria, na verdade era a última coisa que gostaria, mas tinha que falar com Rafaela, era a nota do bimestre!
 - Er... Rafaela? – A garota se virou e fez cara de impaciente quando viu quem a chamara, mas ficou calada. – Nós temos que ver essa coisa do trabalho né? – Ela não expressou reação alguma e ele suspirou. – Olha, acredite em mim, eu queria ser seu par tanto quanto você, então não pense que estou feliz, mas eu já percebi que você não deixa escapar uma nota boa entre os dedos, e não vai deixar passar a oportunidade de ganhar essa nota de graça por me odiar. Vamos tentar nos entender só durante esse trabalho, certo? – Ela estava com uma expressão lívida e indecisa, ela o encarou por um bom tempo e então disse:
 - Combinado. Mas só fico perto de você quando se tratar do trabalho. E o cachorrinho vai ficar na minha casa. – E então ela foi embora. Sérgio ficou aliviado por ter sido tão simples, mas se sentiu agonizado só de pensar em ter que agüentar ela por seis meses, esse seria o trabalho mais difícil de sua vida.
 A tarde passou devagar para Rafaela que já não agüentava mais olhar para o professor de francês e achava chato o pai colocá-la no curso quando ela já era fluente, já fazia francês há seis anos. Ela repetia o que o professor falava automaticamente sem nem mesmo perceber o que ele dizia, ela estava perdida, como se tivesse se deslocado para outro mundo, onde não pensava em nada. Rafaela chegou em casa muito cansada, tomou banho, jantou e foi se deitar. Ela acordou mais indisposta do que nunca, vestiu seu uniforme habitual e prendeu o cabelo em um longo rabo de cavalo. Tomou um shake e partiu para a escola.
 Ela caminhou desanimada pelo longo corredor até sua sala quando foi puxada pelo braço, ela se virou com impaciência. Era Rafael, ela não tinha nada contra ele, mas não queria conversar no momento, portanto continuou com a expressão impaciente.
 - Tudo bem? - Ele perguntou com a sobrancelha um pouco arqueada. – Você não está com uma cara muito boa. – Ela ergueu os olhos e suspirou.
 - Preciso ir pra sala. – Ela se desvencilhou dele e continuou seu trajeto, assim que entrou na sala ela viu Sérgio de costas conversando com Malu lá no fundo da sala. A amiga tinha praticamente a abandonado, sentando ao lado dele todos os dias e alando com ela só no intervalo e olhe lê, mas hoje ela sorriu assim que viu Rafaela na porta e se levantou indo até ela.
 - Bom dia Rafaela! – Ela disse com muita animação. Rafaela passou por ela, colocou a mochila na cadeira, se virou e disse um “oi” seco. – Nossa! O que foi?
 - Nada Maria Luíza. – Ela se virou novamente deu um breve olhar para Sérgio e se sentou. O garoto estava animado essa manhã, ele tinha trabalhado seu psicológico durante toda a noite para não se desentender com Rafaela, afinal seria pior pra ela que teria que engolir o preconceito dela durante seis meses.
 As quatro aulas passaram-se lentamente para Rafaela e rápidas para Sérgio, tocara o sinal quando cada pessoa se uniu ao seu par. Eles se olharam, mas nenhum disse nada. Eles ficaram em silêncio até chegarem ao canil, se identificarem e se dirigirem até o local onde os filhotes estavam. Sérgio notou uma luz nos olhos verdes de Rafaela e segundos depois ela sorriu. O rapaz do canil entregou um pequeno cachorrinho, que mais parecia um ratinho de tão minúsculo, para Rafaela e ela se virou para Sérgio sorrindo, pela primeira vez desde que eles se conheceram.
 - Olha que gracinha! – Ela acolhera o cachorrinho como um bebê.
 - Não precisa fingir vai, ele pode até ficar bonitinho, mas agora ele não é não. – Rafaela ficou séria e Sérgio pensou ter arruinado a paz entre eles até que ela sorriu de novo.
 - É, você tem razão. Hum... – Ela franziu o nariz – Ele está fedorento. – Sérgio sorriu com a expressão dela.
 -É só dar banho nele! – Ele falou como se dissesse: “Dã, é óbvio!”. Rafaela fez cara de espanto, espantando-o também.
 - Ta doido garoto! Ele não pode tomar banho, está muito novo. – Ela ninou o cachorrinho. – Certo, a professora disse que temos que agir como um casal né? – Ela franziu a testa por alguns segundos e continuou – Então vamos para casa, te darei carona, mas vê se não se acostuma. Temos que passar no shopping e comprar ração, xampu antipulga, coleira... – Ela fazia uma lista enquanto caminhava até o carro seguida por Sérgio que estava surpreendido com o comportamento dela.
 Eles entraram no carro e seguiram para o shopping, Rafaela havia aninhado o cachorrinho em sua blusa de frio e o colocado no banco afirmando que ele estava muito fedorento e que ela não ia entrar fedida no shopping. Sérgio ficou no carro conversando entretido com Rodolfo enquanto Rafaela estava no pet shop comprando o que ela julgava necessário. Mais ou menos uma hora depois ela voltou com várias sacolas e as entregou para Rodolfo que já havia descido do carro para guardá-las no porta-malas.  
 - Vamos fazer um trato – Disse Rafaela quando eles já caminhavam dentro de sua propriedade – Ele fica o primeiro mês na sua casa, depois ele vai para a minha. – Ela sorriu com a idéia e ele concordou com a cabeça. – Se você continuar assim nos próximos seis meses o trabalho será legal. – Ele tentou não ficar ofendido – Então tchau. – Ela colocou o cachorrinho em seu colo e lhe entregou uma sacola. – Dê leite para ele, na mamadeira, ele ainda é muito novo... – Se preocupe só com hoje ta, eu não estou largando ele durante o primeiro mês, eu darei mamadeira para ele amanhã... Não, pensando bem eu darei a primeira, eu sou a mãe. – Ela sorriu novamente. Vamos? – Ela foi direção à casa de Sérgio, ele a seguiu. Ele abriu a porta para ela.
 - Pode se sentar ali no sofá. – Ela se sentou cumprimentando Laísa e seu irmão gêmeo, Marcos.
 - Você tem o mesmo nome do meu pai, sabia? – O garoto fez que não com a cabeça. – Ah, Sérgio? Esquente um pouco o leite, o deixe morninho, por favor. – Sérgio fez o que ela pedira e de bom grado surpreso com sua educação.
 Rafaela nunca estivera tão animada, ela dava mamadeira para o cachorrinho, que bebia o leito com esfomiança, com um brilho no olhar, Sérgio a olhava divertindo-se com o animo dela e se perguntando se aquilo duraria por muito tempo.
 - Meu pai nunca deixou eu ter um cachorrinho, e sempre foi o que eu mais quis. E agora ele não pode negar já que faz parte do trabalho. – Laísa estava animada também em ter um cachorrinho em casa.
 - Posso dar um pouco? – Ela disse para Rafaela, que disse que sim e lhe entregou o cachorrinho.
 - Bom, gente, eu tenho que ir, eu tenho alemão ainda, tchau. – Ela saiu, deixando Sérgio muito satisfeito com seu comportamento.
 Rafaela tomou banho e vestiu uma calça jeans, sapatilhas e uma blusa de alça preta. Ela pegou seus livros e partiu para a aula de alemão, mas animada do que quando partia para a escola. Ela já estava se acostumando com a idéia de fazer o trabalho com Sérgio, ele não tinha feito nada a ela durante toda à tarde, mas ela ainda não se dava bem com a outra idéia. A de ele ser negro.

CAPÍTULO OITO
Sentimentos Confusos

 O mês de fevereiro passou rápido na opinião de ambos, Rafaela ainda não perdera a empolgação, estava a cada dia mais feliz com seu “brinquedinho”. Sérgio estava inquieto e preocupado, ela não parava de fazer anotações, e se ela estivesse criticando-o? Mas ele não ousara perguntar. Mas, milagres não acontecem tão rápido, eles ainda discutiam por horas as vezes, Rafaela criara caso com tudo, e Sérgio não baixava seu orgulho, Laísa era sempre quem calava os dois, e sempre dava uma lição de moral. Agora que o filhote já estava com um mês, Rafaela disse que ele já poderia tomar banho. O cachorrinho se transformara em um bonito labrador, o qual Rafaela mimava tanto. Na primeira semana eles já escolheram o nome, “Manhoso”, Sérgio escolhera, disse que ele chorava demais, e Rafaela concordou por achar o nome “fofo”.
 - Bem, hoje vamos dar banho nele, lá em casa. Preciso de ajuda, então... –Ela aninhou o cachorro que já estava demasiado grande e partiu em direção à sua casa, seguida por Sérgio. Ele acompanhou Rafaela escada acima até chegarem no quarto da garota, ela colocou o cachorro no pufe. – Vigia ele, por que do jeito que ele anda é provável que vai devorar todo o meu quarto. – Ela foi até uma porta e a abriu revelando um grande banheiro, ela seguiu até sua jacuzzi e abriu duas torneiras e despejou uma enorme poção de xampu. Segundos depois a banheira estava cheia de espuma e então ela desligou as torneiras.
 - Traga ele Sérgio. – Ela colocou uma toalha em cima de um pequeno banco e pegou o cachorro. – Vamos tomar banho Manhoso da mamãe? – Ela falou com voz infantil. Ele deu um latido alto e ela gargalhou. Ela o colocou dentro da banheira e ele começou a pular, de alegria para a surpresa de Rafaela. – Ele está gostando! – Ela disse empolgada.
 - É da natureza dele Rafaela, além de ser um cachorro, é da raça labrador. – Ela revirou os olhos e se voltou para Manhoso.
 - Me ajuda a esfregar ele. – Os dois estavam se empenhando nisso, mas Manhoso não ajudou muito, Rafaela e Sérgio estavam tão molhados que pareciam estar tomando banho também. Depois Rafaela esvaziou a banheira e ligou a ducha para enxaguá-lo, Sérgio se levantou e abriu a toalha como nome “Rafaela” bordado. Ela colocou manhoso em seu colo e ele se pôs a secá-lo. Já se passara uma hora que eles estavam empenhados na limpeza de Manhoso, eles seguiram para o quarto dela e se sentaram nos pufes, ela colocou uma coleira vermelha nele com um pingente escrito “Manhoso” e do outro lado, “Se me encontra ligue para este número” e um número logo abaixo, tudo invenção de Rafaela.
 - Rafaela? – uma voz grave chamou assustando os dois. O pai de Rafaela entrou no quarto com uma expressão de dúvida.
 - Ai, que susto papai! Estávamos dando banho nesse rapaz aqui – Ela fez carinho na cabeça de Manhoso.
 - Ah – Disse Marcos. – Bem, vamos almoçar. – Ela concordou com a cabeça e olhou para Sérgio não querendo convidá-lo. – Almoce conosco Sérgio.
 - Muito obrigado, mas acho melhor não Dr. Marcos, com licença. – Ele se levantou olhou para Rafaela e saiu. Por um segundo Rafaela pensou ter visto decepção naquele olhar, mas logo percebeu que ele não tinha razão para estar decepcionado.
 - Que falta de educação Rafaela! Além de seu vizinho, e colega de classe, ele é o “pai” do seu filho. – Rafaela olhou com descrença para o pai, que sorriu. – De acordo com o trabalho, é sim. Anda, vem almoçar.
 Rafaela colocou Manhoso em seu devido lugar aonde ele costuma dormir, e desceu as escadas logo depois de tomar banho. Depois de almoçar ela resolveu passar mais uma tarde com Laísa. Ela foi até a casa e chamou por Laísa, mas quem a recebeu foi Sérgio, com um olhar vago. Ele a olhou e chamou a irmã, voltando para dentro da casa, Laísa apareceu com um sorriso de orelha a orelha.
 - Rafaela! – Elas se cumprimentaram com beijinhos e seguiram para a casa de Rafaela.
 - Hoje vou te ensinar mais passos, pode ser? – Laísa concordou, ela amara a última tarde, estava louca para que se repetisse.
 Elas subiram as escadas correndo e arrumaram o quarto do mesmo modo. Rafaela colocou nos clipes, aumentou o volume e clicou em “Single Ladies”.
 - Hoje vamos começar com essa por ser mais popular, porque é fácil e porque você já conhece toda a coreografia, só não sabe colocá-los em prática. – Ela deu play e começou a indicar os passos. Elas repetiram a música sete vezes até que Laísa pegou os passos. – Agora já dá para dançar sem parar, né?
 - Sim. – Laísa concordou já esbaforida. Rafaela deu play e elas se posicionaram. Sérgio resolveu ir falar com Rafaela e chegou lá nesse exato momento. Ele viu a porta entreaberta e parou para vê-las dançar.
 Ele sorriu vendo sua irmã dançar, mas parou ao colocar os olhos sobre Rafaela. Ela dançava perfeitamente sem nem ao menos parecer cansada, diferente de Laísa, jogava os cabelos de ouro com um imenso charme, deixando Sérgio hipnotizado. Até que algo fez ela parar e ele percebeu que fora ele, ela o encarava.
 - O que você está fazendo aqui? – Ela estava corada, mas Sérgio não sabia se era por ele estar ali ou por ela estar cansada.
 - Eu vim... – Ele se esquecera completamente, e então inventou uma desculpa rápida. – Temos que brincar um pouco com o Manhoso, ele vai ficar sedentário desse jeito! – Ele falou tão rápido que quase se embolou nas próprias palavras.
 - Ah, claro, você tem razão. – Ela desligou a televisão e amarrou o cabelo. – Vamos até a praça. – Ela bateu nas pernas chamando Manhoso que veio correndo, ela colocou a coleira. Sérgio concordou, e Laísa olhou em súplica para ele.
 - Você pode ir conosco sim Laísa! – Respondeu Rafaela olhando para Sérgio. Ele não sabia o porque, mas não conseguia mais olhar com ódio para a moça.
 Eles foram caminhando, às vezes correndo atrás de Manhoso, dando gargalhadas a todo o momento, depois de alguns minutos eles chegaram na praça. Tinha um parquinho para as crianças, grama por todo lado. Eles se sentaram na grama enquanto Laísa corria com Manhoso, até se sentar esbaforida. Rafaela então se levantou e começou a correr, ele latia desesperadamente tentando alcançá-la e mordê-la brincando Rafaela não conseguia parar de sorrir. Ela caiu e essa foi à deixa, Manhoso pulou em cima dela e começou a morder e lamber fazendo-a rir mais ainda. Sérgio e Laísa a acompanharam nas gargalhadas.
 Eram cinco horas quando resolveram voltar para casa, eles compraram sorvetes e andavam calmamente, todos exaustos. Inclusive Manhoso. Chegando em casa Laísa correu na frente para poder tomar banho antes de Sérgio e os dois ficaram para trás. Pela primeira vez ambos ficaram sem graça na hora de se despedir.
 - Bem, é... Tchau. – Rafaela disse corando. Sérgio sorriu.
 - Tchau. Até amanhã. – Ela concordou com um aceno e caminhou em direção a sua casa, Sérgio continuou parado olhando-a brincar com Manhoso. Ela era tão linda, pensou ele, com aquele cabelo com aparência tão macia, aquelas bochechas rosadas, os olhos de esmeralda, e o perfume indescritível. Ela olhou mais uma vez para trás e depois correu para dentro. Sérgio estava se sentindo ruim com tudo isso. Ele perdera todo o ódio pela garota só por ela ter sido educada por algum tempo. E se aquilo acabasse junto com o trabalho? Laísa e Malu tinham razão, ela é legal. “E agora, o que está acontecendo?” Perguntou-se Sérgio. Seja o que for, ele não conseguia tirar a imagem dela da cabeça. 
 Rafaela colocou Manhoso em sua caminha e foi tomar banho, ela pensara em Sérgio durante todo esse tempo, ela lembrava do sorriso dele, e sorria consigo mesma.
 - Foco Rafaela, foco. – Ela disse para si mesma. – Você não pode se apaixonar por ele. Você tem o Rafael, ele sim te merece. É um garoto rico, bonito e popular, assim como você. Já o Sérgio... Ele é legal. Sim, sim, eu assumo. Ele até que é legal, mas não posso me misturar profundamente com pessoas como ele. – Ela terminou essa frase juntamente com seu banho, colocou um vestido e desceu para jantar, e assim que terminou deitou-se.
 A noite foi confusa para ambos. Sonharam um com o outro, e ao acordarem do sonho, sorriram, não um sorriso feliz. Mas, sincero e confuso.


CAPÍTULO NOVE
O namoro


 - RAFAELA! – Rafaela deu um pulo ao ouvir o grito de uma voz conhecida, mas que ela não queria escutar no momento.
 - Oi Rafael. – Ela sorriu educadamente. – Desculpe, mas tenho aula de química no primeiro tempo...
 - Eu não vou te tomar muito tempo. Só queria saber se você quer repetir aquilo? – Ela franziu o cenho.
 - Aquilo o que? – Ela não entendia o sorriso imenso que nunca saía daquele rosto.
 - Nosso encontro. Aceita? Mas dessa vez queria levar você ao parque. – Ela não sabia o que responder, seu coração gritava para ela não aceitar, já sua consciência dizia “aceite”. Ela deu um sorriso de lado.
 - Ta, pode ser. – Ela se virou no intuito de ir para a aula.
 - Calma Rafaela! Ainda são sete horas, o professor só entra em sala sete e meia, ta lembrada? – Ela revirou os olhos e se virou para o garoto sorrindo. – Não quer conversar comigo? Vamos ali na lanchonete...
 - Não dá mesmo Rafael, eu ainda tenho que terminar algumas coisas e o professor de química é pontual, você deveria saber disso. Agora, com licença. – Ela desvencilhou seu braço da mão dele e fugiu em direção à sua sala.
 Ela entrou e logo viu Sérgio sentado em sua cadeira com Malu sentada na cadeira da frente, conversando com ele, e no mesmo momento em que ela o olhou ele levantou o olhar, ela sorriu corando e ele acenou, fazendo com que Malu se virasse para ver quem era, e logo vir cumprimentar a amiga.
 - Rafinha! – Ela abraçou a amiga que retribuiu o abraço. Fazia tempo que elas não se falavam direito e ela já estava sentindo falta da amiga. – Hoje vou sentar aqui com você. – Ela sorriu e apontou para a bolsa rosa na cadeira ao lado.
 - Ah, que bom! – Ela disse com total sinceridade.
 - Todos sentando, vamos, vamos. – O professor entrou na sala e logo preencheu todo o quadro. Sérgio revezava em olhar para o quadro e olhar para Rafaela, sacudindo a cabeça em negação toda vez que se pegava fazendo isso.
 As aulas passaram lentamente, o a hora parecia não passar, e Malu cantou vitória no momento em que o último sinal tocou.
 - Graças a Deus! – Glorificou erguendo as mãos. – Hoje só teve aula chata: Química, Física, Redação, Gramática... Urgh!
 - Maria, aquele trabalho de português da semana passada, você já digitou? – Rafaela se espantou e olhou para cima, para os olhos pretos como ébano que a olharam no mesmo instante. Ela corou.
 - Droga! O que está acontecendo comigo? – Ela disse baixinho, mas Malu e Sérgio escutaram e a olharam. Ela fingiu não ter dito nada e eles continuaram o assunto.
 - Então, eu já digitei boa parte, mas ainda não terminei. É para...
 - Amanhã. – Disse Sérgio e Rafaela em uníssono. Rafaela voltou a corar e virou o rosto novamente para suas coisas.
 -Ah, então, eu termino hoje. – Malu disse. - Você não quer ir lá pra casa me ajudar? – Rafaela olhou para Sérgio.
 - Sinto muito Maria, mas eu já fiz minha parte, e sua casa é muito longe...
 - Eu peço para o motorista te buscar! – Malu estava louca para poder ter uma tarde a sós com Sérgio, porém ele não queria isso.
 - Não Malu. – Ela amarrou a cara para ele.
 - Bom, então ta. Eu já vou até amanhã. – Sérgio percebeu que ela ficara irritada, pois não se despediu com beijinhos nem dele nem de Rafaela.
 - Não se preocupe. – Rafaela disse olhando para ele e retirando-o de seus pensamentos sobre Maria Luíza. – Amanhã ela irá agir como se nada tivesse acontecido.
 - Mas não aconteceu nada. – Sérgio deu de ombros. – Tchau Rafaela.
 - Tchau. – Ele saiu, Rafaela tivera vontade de pedir para que ele esperasse e fosse embora com ela, mas o orgulho e o preconceito foram maiores mais uma vez.
 É incrível como esses tipos de sentimento traem as pessoas a todo o momento. Ela sacrificara a chance de ter um amigo por ele ser diferente, por ele ser negro. Por que conhecê-lo, ela conhecia, descobriu que Sérgio é uma ótima pessoa, educado, cavalheiro e gentil, mas ela só pensava nele como um “alien”.


(...).


 Rafaela tomou banho, sem um pingo de animação. Por mais que achasse Rafael lindo, ela não queria sair com ele novamente, topara por educação e para poder se livrar dele naquele momento de pressa, e agora teria que suportá-lo durante a tarde toda. Era um sábado ensolarado, ela colocou um short jeans, uma blusa fina e um tênis all star. Penteou seus cabelos e os deixou soltos. Ela começou a lembrar da última vez que saíra com Rafael, ela não gostou nem um pouco, não queria repetir. Rafael falava e se gabava demais, ela ouviu todas as histórias de suas antigas escolas, seus antigos times, que ele sempre ganhava os campeonatos, que ele foi escolhido como o jogador mirim mais bonito do ano. Rafaela não falou nada, pois ele não deixara. Por mais que Rafaela zelasse seu patrimônio e gostasse de conviver com pessoas ricas não humilhava os outros por terem menos, inclusive ajudava várias instituições e odiava quem se achava melhor por isso. Ela quase mandou Rafael calar a boca, mas mordeu o lábio “Isso não vai pegar bem” ela pensou, sorrindo educadamente e continuando com sua onda de acenos de concordância.
 Ela seguiu seu caminho, cada vez mais desanimada assim que se aproximava do parque, e então ela avistou a figura pálida sentada em um dos bancos olhando para todos os lados até focalizá-la e andar em sua direção com aquele enorme sorriso.
 -Rafaela! – Ele a abraçou e ela retribuiu secamente.
 -Oi.
 - Você está linda! Surpreende-me cada vez mais. – Ela deu um leve sorriso e concordou com a cabeça;
 - Obrigado, mais uma vez.
 - Vamos ali, quero comprar um sorvete para você. Presumo que o seu sabor favorito deve ser chocolate. Todas as garotas amam sorvete de chocolate.
 - Eu odeio sorvete de chocolate. Gosto de sabor flocos. – Ele ficou sem graça com o erro e comprou os sorvetes em silêncio, eles se sentaram em um banco mais afastado, a pedido de Rafael.
 - Eu te fiz esse convite mais num intuito de lhe pedir desculpas. – Rafaela surpreendeu-se e pela primeira vez olhou nos olhos do rapaz. Aquele azul a deixava tonta, meio submersa naquele mar, sim, os olhos dele pareciam o mar de tão azuis. – Eu agi totalmente errado no nosso primeiro encontro, aquilo foi uma gafe. Falei apenas de mim, não lhe dei chance alguma de falar – ela concordou com a cabeça – E eu estou me sentindo mal por isso. Queria que tivéssemos um novo recomeço, eu estava nervoso, queria tanto causar boa impressão, e fiz tudo errado. Você me desculpa? – Como não desculpar uma pessoa que fala tão bem e sinceramente, com aquele olhar.
 - Claro Rafael! Todo mundo erra. – Ele sorriu.
 - Prazer senhorita – ele se ajoelhou na sua gente pegando sua mão livre e a beijando – Sou Rafael, e você...
 - Rafaela. – Ela disse se divertindo com a brincadeira. Ele sorriu junto com ela e de repente parou, olhando de seus olhos verdes para sua boca rosada. Rafaela percebeu e corou no mesmo instante, ele se aproximou cada vez mais de seu rosto, e ela ficou quieta, ainda submersa naquele olhar. Rafael beijou-a. Ela pensou que se incomodaria, mas não, se sentiu feliz com aquilo. Ele se afastou e lhe deu um beijinho rápido.
 - Rafaela?
 - Hum? – Ela respondeu olhando-o nos olhos.
 - Você quer ser minha namorada? – Ela ficou totalmente rubra, e não sabia o que dizer. Ela pensou no beijo que acabaram de dar, ela gostara. Porque não?
 - Quero. – Ela sorriu, e ele a beijou de novo.
 Eles passaram toda a tarde juntos e depois ele a deixou em casa. Assim que passou pelo portão Rafaela deu de cara com Sérgio. Sem saber o porque, ela corou. Fingiu não tê-lo visto e entrou. Sérgio por outro lado a viu, e muito bem, se despedindo de um garoto com um beijo. Ele se sentiu afetado por aquilo, não entendia o porque, mas se sentia.
 Sérgio acordou bem disposto, tomou seu café e seguiu em rumo à sua jornada. Hoje seus irmãos não tiveram aula, portanto ele não precisou levar Denise a creche e pôde sair de casa um pouco mais tarde.
 Chegando na escola ele viu Rafaela de mãos dadas com o tal garoto. Ele passou pelos dois e foi para a sala, sentando em seu lugar habitual e sendo recebido muito bem pro Malu, ele riu lembrando-se do que Rafaela disse.
 A primeira aula foi de português, todos entregaram seus trabalhos e a professora voltou a perguntar sobre o trabalho.
 - Como está indo o trabalho turma? – Rafaela e Sérgio se olharam. Já fazia uma semana que não cuidavam juntos de Manhoso. Somente Rafaela o estivera alimentando e de vez em quando brincando com ele no gramado do jardim.
 - Bem! – Respondeu a turma em uníssono.
 - Que bom, espero que os “casais” tenham vencido algumas diferenças. – Ela olhou por cima dos óculos para Rafaela e Sérgio. Agora, vamos ao que importa, hoje o tema da redação é “A ingenuidade dos brasileiros quanto à política”, entrega até o fim dessa aula.
 Saindo da aula Rafaela foi direto ao encontro de Rafael, que a esperava na porta de sua sala. Rafaela sempre ficava surpresa com a beleza de seu namorado.
 - Oi – Ela sorriu e lhe deu um leve beijo.
 - Oi. Está de pé nosso programa?
 - Tive uma idéia melhor Rafael. Quero que você vá até minha casa, conhecer meu pai. Amanhã, pode ser? – Rafael ficou espantado.
 - Como assim conhecer seu pai? Pior ainda, amanhã? Ta louca Rafaela? – Rafaela ficou boquiaberta, vermelha como um pimentão de tanta raiva. Sérgio e Malu estavam parados ali perto. Perto o suficiente para ouvir Rafaela explodir.
 - Como assim digo eu. Você não quer conhecer meu pai? – Rafael revirou os olhos.
 - Não é isso Rafinha, é que é rápido demais na acha? – Ela colocou a mão na cintura.
 - Se já estamos namorando, está tarde demais meu amor. – Ela ironizou a palavra “amor”.
 - Ah Rafaela, convenhamos, você não liga para essas coisas né? – O sangue da garota pareceu ter ido todo para o rosto.
 - CHEGA RAFAEL! OU VOCÊ VAI ATÉ MINHA CASA AMANHÃ, CONHECER MEU PAI, OU ESTÁ TUDO ACABADO! – Ela berrou, chamando a atenção de todos, fazendo Rafael ficar vermelho e impaciente. Ela marchou em direção ao portão e foi embora, com Rodolfo já a sua espera. Sérgio não pôde impedir soltar um sorrisinho com a cara do rapaz. Malu tinha as sobrancelhas erguidas, e olhava para Sérgio incrédula.
 - Você ouviu isso?
 - Pelo visto o Rafael deixou a Rafaela furiosa. – Ele riu coma ironia dos nomes do casal.
 - É, acho que sim. Vou conversar com ela hoje. Deixa-me ligar pra ela... – Ela tirou o celular da bolsa e discou um número bem rápido. Ela ficou olhando Sérgio com sorriso nos lábios. Além de conversar com a amiga poderia ver o garoto.
 - Alô? Êpa, calma Rafaela, o que é que te deu mulher? Mas não faz nem uma semana que vocês estão juntos... Tem certeza? É... – Sérgio estava meio confuso. – O.K., posso ir à sua casa hoje à tarde? Ah é verdade, eu me esqueci. Ah, então ta. Às sete. Beijos. – Ela guardou o celular e se virou para Sérgio. – Hoje ela tem aula de francês, eu havia esquecido.
 - E a aula dela dura a tarde toda? – Ela disse com desdém.
 - Sim, de duas às seis. – Ele ergueu as sobrancelhas.
 - Nossa! Bem, então, até mais tarde, talvez. Tenho que ir. Tchau. – ele beijou Malu na testa a deixando nas nuvens.





CAPÍTULO DEZ
O beijo

 - Então você é namorado da minha filha? – Disse Marcos alternando o olhar entre Rafaela e Rafael.
 - Sim. Estamos juntos a uma semana.
 - Uma semana? – Ele ergueu olhou para a filha, que não se intimidou e sorriu. – E você vem falar comigo, hoje?
 - Na verdade era para eu ter vindo na sexta feira passada, mas não deu, e a Rafinha ficou muito brava com isso, queria que eu viesse conversar com você. – Rafaela sorriu mais ainda, sabendo que conquistara pontos com o pai após aquilo.
 - O que você pretende fazer da vida, Rafael? – Rafael quase se engasgou com seu suco, e mandou um olhar de reprovação para Rafaela, que ficou indiferente.
 - Bem, eu ainda não sei... – Dessa vez Rafaela se engasgou.
 - Rafaela, querida. – Seu pai tentou socorrer, mas ela logo se recompôs.
 - Tudo bem papai, tudo bem. – Ela olhou com desagrado para Rafael, juntamente com seu pai.
 - Então você já está no terceiro ano, prestes a se formar no colegial, e não sabe o que quer fazer ainda? – Ele fez que não com a cabeça.
 - Quero um ano de folga Marcos. Estudei quinze anos seguidos com apenas meses de descanso, agora que posso ficar mais tempo, claro que vou descansar. – Marcos e Rafaela tinham o mesmo olhar de reprovação.
 - Bom saber, garoto. Você é sincero. – Ele olhou para a filha que encarava Rafael, que estava indiferente no momento.
 O jantar seguiu silenciosamente, Rafaela evitou olhar para o namorado, estava espantada até agora com a irresponsabilidade do rapaz. “Um ano de folga?” Rafaela pensou, que idiotice, nesse ano de folga ele ia perder quase todo o aprendizado da escola, e mais, se ele queria esse tempo, ele não faria nenhuma prova de vestibular. Queria viver do suor dos pais, que medíocre.
 - Acho que está na minha hora. – Rafael se levantou. Marcos o olhou, e se levantou.
 - Certo, até a próxima... – Ele olhou para a filha.
 - Vou acompanhá-lo até o portão papai, licença. –Ela também se levantou, retirando-se com Rafael. Assim que passaram pelas portas, ele tentou beijá-la, que o empurrou com força.
 - Você é um idiota Rafael! E eu não vou te beijar, me larga! – Ele revirou os olhos e colocou as mãos no bolso.
 - O que foi agora, Rafaela? – Ela ficou indignada.
 - Ai meu Deus! Em que mundo você vive garoto? “Quero um ano de folga Marcos. Estudei quinze anos seguidos com apenas meses de descanso, agora que posso ficar mais tempo, claro que vou descansar”.- Ela fez uma imitação da voz dele. – O que você acha que meu pai pensou? Ou melhor, o que eu pensei. Que futuro você vai poder me dar?
 - Nossa Rafaela! Não sei se você se lembra, mas eu sou rico. – Ele enfatizou a última palavra.
 - Seus pais são ricos. E eu não quero um namorado que sustente nossos passeios com dinheiro do papai ou da mamãe, francamente, você não devia se orgulhar disso. – Ele revirou os olhos novamente.
 - E eu não quero uma namorada que me encha o saco por causa de tudo. – Ela abriu a boca em um perfeito “o”.
 - Vá. Embora. Agora. – Ela já estava vermelha.
 - Ótima idéia. – Ele saía, quando se virou e voltou até ela. – Eu disse que esse encontro não daria certo.
 - Deu mais que certo, me mostrou quem você é. Ta tudo acabado Rafael, não quero mais falar com você. – Ela cruzou os braços.
Ele a puxou para bem perto, de um modo que sentiam a respiração um do outro, e sibilou:
 - Nenhuma garota termina com Rafael Montenegro. – Ela sorriu e o empurrou.
 - Eu termino. Agora some. – Ele sorriu, e a olhou de longe.
 - Você que pensa. – Ela revirou os olhos.
 Assim que ela viu que ele realmente havia ido, ela se virou para voltar para dentro, e trombou com Sérgio, que segurou, quando ela quase caiu.
 - Droga Sérgio! – Ela se soltou dele. – O que você ta fazendo aqui?
 - Eu ia falar com você. – Ela fechou os olhos e passou a mão na testa ainda vermelha.
 - Tem que ser hoje? – Ela abriu os olhos e o fitou. Ele fez que sim. – Então fala. Não... Vamos até o jardim. – Eles seguiram para os fundos da casa, e se sentaram em um banco.
 - É sobre o trabalho. – Rafaela o estava fitando, antes mesmo dele falar. Ela olhava desconfiada.
 - Você ouviu alguma coisa Sérgio?
 - Eu... É... Não... Ouvi o que? – Rafaela gargalhou com a gagueira repentina de Sérgio.
 - Ouviu o que é? Tudo bem, eu não ligo. – Ele abaixou os olhos.
 - Eu não tinha intenção de ouvir, mas quando cheguei lá vocês estavam conversando e eu não pude interromper. – Ela fez que sim com a cabeça.
 - Eu já disse, tudo bem. O Rafael é um idiota... Você ouviu toda a conversa? – Ela o olhou e ele concordou. – Onde já se viu, um ano de folga... – Ela fez sinal de negação com a cabeça. – Não sei onde eu estava coma cabeça por namorar alguém como ele. Eu sempre fui muito exigente quanto a namorados... – Ela novamente fitou Sérgio. – Você é uma boa pessoa Sérgio. – Ele olhou para o chão sorrindo. – É sério, acho que te julguei cedo demais. – Ela se levantou e sentou a lado dele. – Você é o melhor pai que o Manhoso poderia ter. – Nesse momento os dois gargalharam.
 Os dois pararam de rir lentamente, perceberam que estavam muito próximos, mas nenhum se moveu. Passados alguns segundos, eles se moveram, para mais perto, e se beijaram, lenta e apaixonadamente.
 De repente, Rafaela se separou daquele beijo e ergueu as sobrancelhas. Ela o encarou por pouco tempo, e se levantou.
 - O que você pensa que está fazendo? – Sérgio ficou assustado coma reação dela.
 - Oras, eu não fiz isso sozinho! – Ela abriu a boca pra dizer algo, mas fechou, duas vezes, e então na terceira conseguiu falar.
 - Você me usou! – Ela apontou um dedo para ele, que ficou de pé, sorrindo indignado, e apontando para si.
 - Que ridículo, assuma seus atos Rafaela!
 - Isso nunca aconteceu, está me ouvindo? Nunca. – Ela saiu correndo em direção a casa, enquanto Sérgio precisou de mais algum tempo para processar o que acabara de acontecer, e depois ir para sua casa.
 Para Rafaela aquele fora o melhor beijo de sua vida. Não que ela tenha beijado muitos outros além dele e Rafael, mas ainda assim. Ela não sabia o porque, mas fora doce. Sérgio tinha um beijo suave. Diferente de Rafael, mas ela não poderia gostar de alguém como ele. Aquilo foi um momento de fragilidade, ela tinha acabado de terminar um namoro. Depois de se convencer com essa tese ela foi se deitar.
 Já Sérgio remoeu aquilo durante toda à noite, tanto quando ele estava acordado tanto quando ele dormira, tendo sonhos com Rafaela. “Porque ela me beijou, droga”.Ele pensou. Se aquilo não tivesse acontecido, ele não estaria naquele tormento. Tinha que ter sido culpa dela. Mas ele também não parara de pensar no quanto foi bom beijá-la.


CAPÍTULO ONZE
O baile

 Passaram-se dois meses, e Rafaela se concentrara em evitar Sérgio ao máximo, e vice-versa, porém, ambos não paravam de pensar um no outro. Quanto à Manhoso, Rafaela cuidava semana sim, semana não, pedindo que Laísa o levasse para casa, para não ter que falar com Sérgio, certo dia Laísa disse que ela não deveria fazer isso, devido às anotações que teria de entregar a professora, mas Rafaela disse que isso não seria problema.
 - Toc-toc... – Toda a turma olhou para a porta, e a professora a abriu. Era a Senhorita Bellmonte, a diretora. – Licença. – Ela disse e entrou na sala. – Bom dia turma!
 - Bom dia! – Responderam em uníssono, todos curiosos pela visita da diretora.
 - Não se preocupem, não vim dar bronca em ninguém, vim trazer boas notícias, pelo menos acredito que sejam. Já estamos no mês de maio, e como tradição da escola... – Ouviram-se alguns “Ah”, inclusive de Rafaela, mas Sérgio, por ser novo ali, não fazia idéia do que ela falava. -... Haverá um baile. Será das oito horas às onze. Como sempre terá de tudo, porém, não haverá bebida alcoólica. – Mais alguns “Ah” – E, como tradição, todos deverão ter um par, e haverá uma valsa. O baile será na próxima sexta feira, acho que o tempo está bom para vocês não é mesmo – “Não” algumas garotas murmuraram – Bem, é só isso pessoal, obrigado pela atenção, e desculpe atrapalhar a aula professora.
 - Que isso Srtª Bellmonte. – A diretora se retirou e começaram os murmúrios. – Silêncio turma, voltando à aula, atenção.
 Assim que o sinal tocou, Maria Luíza se levantou e foi até a cadeira de onde Sérgio se levantava.
 - Quer ir ao baile comigo? – Sérgio foi pego de surpresa, ficou paralisado pro alguns segundos. Ele olhou mais à frente e viu Rafaela os olhando, e desviando-se assim que seu olhar recaiu sobre ela. Na verdade Sérgio queria poder convidar Rafaela, apesar dela o tratar mal, dela ser preconceituosa com ele, devido a sua cor, ele queria ter o prazer dançar valsa com ela, ele começou a imaginar com ele estaria vestida, mas então olhou para o rosto ansioso de Malu e lembrou quem é que sempre lhe deu valor.
 - Claro que eu quero Malu. – Ela mostrou um grande sorriso, que também estava em seus olhos, como Sérgio pôde ver, ele olhou para frente e viu que Rafaela já não estava mais na sala. Ele deu um beijo na testa de Malu como de costume e retirou-se.
 Rafaela não sabia o porque, mas sentia um ardor no nariz, eram as lágrimas que se aproximavam, mas porque ela queria chorar?
 - Droga! – Ela murmurou e apressou o passo, mas parou de repente quando uma voz grossa a chamou, ela se virou e viu um rapaz alto, loiro e de olhos verdes, ela sorriu com a semelhança entre eles.
 - Oi. –Ela respondeu ainda sorrindo.
 - Eu queria te fazer uma pergunta. Quer dizer, primeiro, eu sou Júlio, prazer. – Ele estendeu a mão que Rafaela gentilmente apertou. – Você quer ir ao baile comigo? - Rafaela pensou por um momento, o rapaz parecia ser gente boa, porque não? Era só uma noite na escola, e só iriam dançar.
 - Quero sim. – Ela sorriu, e ele mais ainda. – Mas agora tenho que ir Júlio. Tchau. – Ela acenou e foi em direção ao carro já a sua espera.
 Rafaela só tinha aula de alemão hoje, então assim que saiu da aula pediu para Rodolfo a levar ao shopping. Ela queria já comprar seu vestido. Depois de rodar quase todas as lojas, ela encontrou um vestido e se encantou, além de ser lindo caiu perfeitamente nela.
 Era um vestido longo, de seda, verde, com detalhes de muito brilho no corpete que era amarrado atrás. O vestido tinha alças, porém ficavam caídas nos ombros, dando efeito de tomara que caia.
 - Você está linda Rafinha, realçou a cor dos seus olhos. – Ela sorriu. O vestido realmente caíra como uma luva. – Você vai com o Sérgio? Vi vocês dois outro dia no jardim... – Rafaela corou na mesma hora, mas vermelha que uma pimenta.
 - Não seja ridículo Rodolfo! Vou com um garoto muito bonito que está a minha altura. Júlio. – Rodolfo sorriu e se calou. Rafaela tirou o vestido e o comprou. Depois ela foi até uma loja de calçados e comprou uma sandália prata, e em seguida marcou hora no cabeleireiro.
 - Agora está tudo pronto. Podemos ir Rodolfo. – Rodolfo carregava as sacolas, enquanto ela comentava que no último ano ela tinha feito tudo isso com Malu, mas esse ano a amiga lhe trocara por um qualquer. Já no caminho de volta Rafaela ficou calada olhando pela janela.
 A semana passou bastante rápido na opinião de Rafaela. Chegara o dia do baile, que estava passando muito rápido também, ela mal acordara e já estava no cabeleireiro as cinco da tarde. Ela fez um tratamento de uma hora, e depois disso o seu cabelo foi arrumado em um formoso coque, com alguns fios soltos na lateral, e a franja de lado. Ela terminou tudo eram sete horas, e ela foi o mais rápido possível para casa. Trocou de roupa, e partiu para a escola.
 Sérgio já estava na escola à espera de Malu, quando viu a imagem de uma linda garota de pele muito branca em destaque com o cabelo preto e o vestido de um vermelho vivo, a garota sorriu para ele. Maria Luíza chegara, mais linda do que nunca. Ela sem dúvidas era a mais bonita ali, ele foi até ela, se ajoelhou e beijou sua mão delicadamente.
 - Boa noite bela dama! – Ela sorriu, se divertindo com a situação. – Gostaria de acompanhar esse pobre e humilde cavalheiro?
 - Com todo o prazer do mundo! – Eles saíram de braços dados, em direção a mesa de quitutes.
 E então chegou a vez de Júlio encontrar sua bela dama, ele estava sentado olhando quase sem piscar para a porta à espera de uma imagem loira chegando. E depois de tanto esperar, ele viu o que tanto esperara. Sérgio a Malu haviam voltado para lá e se sentaram em uma mesa próximo a ele, quando Rafaela chegou. Atraindo todos os olhares para si. Sérgio ficou paralisado. Nunca vira uma garota tão bonita em sua frente. Claro, Malu estava linda, e estava o acompanhando, mas Rafaela estava esplêndida. Usava um lindo vestido verde de seda com muito brilho na parte de cima, seus lindos cachos loiros estavam presos em um formoso coque, com algumas leves mechas soltas de cada lado de seu lindo rosto, que estava rosado, como de costume, mas hoje seu olho estava bem marcado com lápis de olho, destacando seu verde. Só então Sérgio percebeu o corpo branco e loiro que pairava ali na frente, a espera da moça, que estendeu a mão gentilmente para ele, que a beijou, assim como Sérgio fizera com Malu.
 - Ela está tão linda! – Disse Malu. – Como em todos os outros anos desde a primeira série.
 Sérgio ficou imaginando como Rafaela estará vestida na primeira série, com seis ano de idade, ele sorriu com a imagem de uma garotinha loira parecendo uma princesinha. Ele voltou a olhar Rafaela, e seus olhares se encontraram, ela ficou mais rosada do que já estava, e baixou os olhos. As oito e meia, a Srtª Bellmonte subiu ao palco improvisado, e anunciou o começo do baile, os alunos cantaram o hino da escola, e segundos depois ela se retirou, começou a tocar a música “Here Without You”, fazendo com que todos os casais dançassem juntinhos. Sérgio tentara se concentrar em seu par, Malu, mas estava se queimando por dentro de ver Rafaela abraçado com aquele garoto que mais parecia ser seu irmão. Mal sabia ele que Rafaela sentia o mesmo ao vê-lo com Maria Luíza, e se sentia pior, por pensar algo do tipo, e por ser logo com o garoto que a amiga gosta.
 Sérgio estava tentando se concentrar em Malu, quando ela o surpreendeu com um beijo, Rafaela olhou para o casal nesse exato instante e ficou chocada, sentindo novamente o ardor em seu nariz e os olhos marejarem. Ela pensou que seria capaz de segurar, mas as lágrimas já estavam descendo deliberadamente pelo seu rosto, Júlio a olhou e ficou surpreso.
 - O que foi Rafaela? – Ele tentou limpar seu roto, mas ela se afastou, no exato momento em que Sérgio a Malu se desvencilharam, e saiu correndo, atraindo a atenção de Sérgio. Malu o olhava com um sorriso nos lábios, sem notar a amiga.
 - Eu já volto Maria. – Ele disse e seguiu pelo mesmo caminho que Rafaela, tentando encontrá-la. Quando chegou no jardim da escola ouviu murmúrios e encontrou Rafaela sentada no gramado, com o rosto apoiado nos braços. Ele se aproximou, tentando não fazer barulho, mas decidiu chamá-la, quebrando o silêncio de dois meses de ambos.
 - Rafaela, você está bem? – Ele estava realmente preocupado, a garota ergueu a cabeça e o olhou com os olhos borrados pela maquiagem.
 - Está tudo perfeitamente bem, é por isso que estou chorando. – Ela disse sarcasticamente.
 - Nem assim você me trata com educação?
 - O que você está fazendo aqui garoto? Ninguém te chamou aqui, ninguém. – Ela colocou-se a secar as lágrimas que não paravam de descer.
 - Sua ingrata! Eu fiquei preocupado com você! – Ela o fitou. – Você chega toda sorridente, inabalável, e de repente sai correndo e chorando pelo salão.
 - E você de repente beija a Maria Luíza!- Ela vociferou, e Sérgio sentiu como se uma chama ardesse em seu peito, ela estivera com ciúme?
 - Ela me beijou. – Ele tentou explicar.
 - Ah, CALA A BOCA! – Ela gritou. – Vai embora daqui.
 - Você está chorando porque eu e a Malu nos beijamos? – Rafaela se levantou e ficou mais próxima dele.
 - Nunca! – Ela sibilou.
 - Então porque você tocou no assunto?
 - Você não merece a Malu, eu já disse, que coisa! Vai embora! – Ela acenava com as mãos para ele sair.
 - Não, eu não vou. Rafaela, se você gosta de mim, porque não assume?
 - Eu não gosto de você!
 - Então porque está chorando por eu e a Malu...
 -EU NÃO ESTOU CHORANDO POR ISSO! – Ela o empurrou e correu, correu o mais rápido que pôde, atravessou o salão em segundos e correu rua afora.


CAPÍTULO DOZE
O psicopata

  Depois de minutos andando ela sentiu como se estivesse sendo seguida, e virou-se disposta a começar uma nova discussão com Sérgio, mas não viu ninguém. Ela virou-se e continuou caminhando. Teve a sensação novamente e se virou rápido, ela olhou para os lados não reconhecendo a rua em que estava, a rua estava deserta, somente ela e as luzes dos postes. Pela primeira vez na noite ela se sentiu fria, e se arrepiou. “É melhor voltar”. Ela pensou consigo mesma e pôs-se a caminhar pelo sentido contrário, quando foi surpreendida por um empurrão que a derrubou. Ela se virou e deparou-se com um corpo alto e esguio e grandes olhos azuis, azuis como o mar.
 - Rafael? – Ela tentou se levantar, mas o garoto a empurrou novamente.
 - Sim, meu amor, sou eu. – Ela sentia dor nas costas e nos joelhos.
 - O que você pensa que está fazendo? – Ela se afastou para conseguir levantar, dessa vez Rafael não a derrubou.
 - Eu te disse que ninguém termina com Rafael Montenegro. – Ela revirou os olhos.
 - Ah, tenha dó Rafael, eu tenho que voltar para a escola. – Ela deu as costas e Rafael a puxou pelo cabelo, que depois de tudo estava preso em um rabo.
 - AI! – Ela gritou. – Me larga garoto!
 - Quando você aprender a me respeitar, talvez. – Ele olhou para os lados. – Aqui não vai dar certo, alguém pode ouvir seus gritos de dor. – Rafaela ergueu as sobrancelhas, assustada. - Mas pensando bem, basta calar essa sua boca. – Ele deu um soco na boca de Rafaela, a fazendo guinchar de dor, ele a segurou fortemente, rasgou um pedaço de sua blusa e a amordaçou, e então a atirou no chão novamente.
 As lágrimas de Rafaela que antes tinham cessado voltaram a cair incessantemente, ela tentou tirar a mordaça, mas Rafael foi mais rápido e lhe deu um chute nas costelas, ela soltou um grito abafado.
 - Você sofrerá bastante essa noite Rafaela, aposto que nunca sentiu muita dor não é mesmo? Você é muito ingênua Rafaela, tola demais. Você achou que eu namoraria alguém como você? – A garota ainda se remoia de dor, deitada no chão. – É, você é uma garota muito atraente, a mais bonita do colégio na minha opinião, se você quer saber, mas você é muito certinha, já parou pra pensar nisso? Sempre cheia de deveres, de escola, de curso, treinos de tennis, vôlei, basquete, blá blá blá. Cansei, meu amor. E ainda vem me dizer, o que eu devo fazer da minha vida, francamente Rafaela! Eu te queria por prazer, e você optou por me abandonar, agora, você vai se arrepender. Mas não se preocupe, não vou abusar de você. Você merece sentir mais dor. – Ela gemeu. – HAHAHAHAHAHA! - Ele gargalhou, tendo prazer em vê-la sentir dor. – Isso não é nem o começo. Levanta! – Ela ergueu os olhos, mas ficou paralisada. – Eu disse levanta! – Ele a puxou pelo braço e a colocou de pé, sua boca sangrava. Ele a olhou nos olhos e sorriu, apertou os braços da garota com tanta força que ela sentiu dormência, e depois a empurrou contra um poste, onde ela bateu com força e caiu no chão. – Agora, já posso abrir o jogo. – Ele arrumou os cabelos, e a encarou. – Você nunca se perguntou porque um garoto tão lindo e atraente como eu não tinha namorada? Ah espera, já sei! Você pensou, que eu era diferente, e estava esperando a garota certa, você. – Ele gargalhou novamente. – Eu tive três namoradas, ano passado. Todas têm marcas pelo corpo, deixadas por mim. – Rafaela gemeu novamente, tremendo de frio e medo, com sangue escorrendo de sua boca, e seus ombros desnudos ralados. – Nas três eu fiz questão de bater, bastante, e ameacei, por isso nunca fui denunciado, mas uma, quis ser mais esperta, tentou fugir, e quando eu a capturei, escrevi um “R” em suas costas. Com uma faca. – Mais um gemido. – Talvez se você se comportar, eu não precise estragar tanto essa sua pele tão macia. Mas, agora, é que vai começar a tortura, vá, corre, isso torna mais divertido.
 Rafaela ficou paralisada. Ela queria correr, mais não conseguia, era informação demais, e suas pernas pareciam ter vontade própria. Sentia uma dor profunda por todo o corpo. Mas ela devia tentar, talvez ela conseguisse correr mais rápido que ele, ela é uma atleta. Ela se levantou, olhou para todos os lados e para Rafael, ele tinha o rosto inexpressivo.
 - Corre! – ele falou novamente, bastante sereno dessa vez. Rafaela sentiu dificuldade em respirar e correu. Rafaela corria sentindo fortes dores nos pés, descalços contra pedras no chão. E, como já era de se esperar, ela tropeçou no seu vestido e caiu de cara do chão, sentindo o gosto de seu próprio sangue. Ela ouviu Rafael gargalhar e vir até ela. Ele a levantou pelos cabelos e a soltou bruscamente, ela bateu a cabeça, sentiu como se ela tivesse se rachado, teve náuseas e tontura. Rafaela ouviu passos, e fechou os olhos, sua hora tinha chegado, ela se sentiu mal por não ter confessado seu amor por Sérgio, o único de quem ela realmente gostara. Rolou apenas uma lágrima sobre sua face, e então ela fechou os olhos, se entregando, até ouvir a voz de Rafael sair engasgada.
 - Que merda é... – Ela abriu os olhos esperançosos e tentou se levantar conseguiu erguer a cabeça o suficiente para ver Sérgio socar o estômago de Rafael, ela sentiu o peito inflar.
 Aquilo foi o suficiente para Rafaela lutar. Ela fez todos os esforços possíveis, ignorando as dores que sentia e se levantou. Neste momento Rafael derrubou Sérgio e caiu em cima dele, lhe socando a face, Rafaela desatou a mordaça e gritou, gritou tudo o que tinha sufocado. Sérgio empurrou Rafael, e se virou para ela.
 - Vai embora, Rafaela, agora! – Rafael lhe acertou outro soco no rosto. Rafael não queria deixar Sérgio ali. Ela pensou por um momento, e viu que não havia outro modo de ajudá-lo, ela tinha que buscar ajuda. E mais uma vez ela correu com toda sua força e velocidade, ignorando as pedras em seus pés. Ela virou uma esquina, sem saber par aonde ia e trombou com um homem.
 - Por favor, me ajude, por favor! – Ela se agarrou ao braço do homem, que estava espantado com a situação da garota.
 - Calma, calma, o que aconteceu? – Ela não tinha mais fôlego, segurou a mão dele e o arrastou até os garotos. Quando chegaram lá, Rafael tinha uma grande pedra nas mãos, e Sérgio estava desacordado no chão.
 - NÃO! – Rafaela gritou, prendendo a atenção de Rafael em tempo do homem retirar a pedra de suas mãos, e segurá-lo. Rafael tinha o rosto muito machucado, mas não tanto quanto o de Rafaela. Ela correu até Sérgio chorando.
 - Ligue para a polícia! – O homem ordenou, lhe jogando o celular quando ela se virou para ele. Ela levou alguns segundos até conseguir discar o número em meio à tremedeira em que estava.
 - Por favor, é uma emergência, tem um louco aqui, um maníaco, ela tentou me matar, e tem um rapaz desacordado, por favor!
 - Qual o endereço? – Perguntou uma voz grossa do outro lado da linha. Rafaela hesitou.
 - Eu não sei. – Ela chorou mais ainda.
 - Coloque o celular no meu ouvido. – O homem ordenou, e ela foi logo até ele, cambaleando, ela colocou o celular e o homem falou se esforçando para segurar as mãos de Rafael, e ela não tirava os olhos de Sérgio, que começara a se mexer. Ela correu novamente até ele. E ficou por cima dele.
 Sérgio sentiu todo o corpo dolorido, e sentiu o odor de sangue, sua cabeça latejava muito, ele preferiu não abrir os olhos. Depois de muitos minutos ele ouviu som de sirenes, que aumentaram sua dor de cabeça, e então com esforço ele abriu os olhos. Ele viu uma imagem, que seria assustadora se ele não tivesse reconhecido aqueles olhos verdes. Rafaela chorava sobre ele, tinha o rosto cheio de sangue, os dentes vermelhos, também sujos de sangue, e sorriu em meio às lágrimas quando Sérgio abriu os olhos, e ele não pôde evitar sorrir também.
  - Com licença! – Disse uma voz suave, porém firme. – Dirija-se até a ambulância, por favor, querida. – Rafaela cambaleou até a ambulância aonde duas enfermeiras vieram ao seu encontro, sentaram-na e puseram-se a limpar seus ferimentos, causando forte ardência, e lhe fazendo curativos.
 - Saiam da frente, RAFAELA! – A garota se virou e viu seu pai correndo em sua direção. – Ah minha filha, meu Deus, o que houve. Garoto desgraçado. – Rafaela começou a chorar novamente se lembrando de tudo que acontecera horas atrás.
 - Ah papai! – Ele a abraçou, levemente, quando ela se comprimiu com a ardência de seus ferimentos nos ombros.
 - Tudo bem, passou meu amor, passou. – Ele acariciava o cabelo despenteado dela.
 - Se...Não...Fosse o...Sérgio...Eu... – Ela dizia entre soluços.
 - Certo, certo. Ele também está melhor, eu devo minha vida a ele agora. – Ela chorou mais no ombro de seu pai.
 - Eu quero ver ele, cadê ele? – Ela fez menção de levantar, mas seu pai a impediu.
 - Ele está bem! Se preocupe com você agora, termine seus curativos, eu vou conversar com o policial, e com os responsáveis por aquele psicopata.


CAPÍTULO TREZE
A declaração


 Sérgio estava em casa, deitado em sua cama, em meio a pensamentos. Ele não vira Rafaela desde o dia do baile, isso já fazia uma semana. Rafael o havia acertado uma pedra nas costelas, lhe dando dias de atestado. Ele ainda sentia muita dor, o simples ato de respirar lhe causava dor. Mas ele se sentia pior por Rafaela não tê-lo visitado. Não que ele tivesse feito aquilo pensando em troca, mas ele salvara a vida dela. Seu estômago retorcia só de lembrar de ver Rafael derrubá-la no chão com tanta força, e vê-la tão ferida. Cafajeste. Sua atenção foi desviada pela entrada de Marcos no quarto.
 - Você está melhor? – Perguntou o garoto se sentando na cama ao lado.
 - É, acho que sim. – Ele olhou para a cama de cima.
 - A Rafaela já voltou a estudar. – Sérgio olhou atento para o irmão. – Ela veio aqui hoje mais cedo, pedir suas anotações, sobre o trabalho, sabe, do Manhoso... – Sérgio confirmou.
 - Mas ainda não está na data de entregar...
 - Ela disse que a professora quis adiar tudo.
 - Ah. – Sérgio se odiou por ter dormido até tarde.
 - Ela disse que não vai devolver Manhoso de jeito nenhum. – Ele sorriu. – Você devia ter visto, ela disse toda autoritária, que, não devolveria, e que eram pessoas muito cruéis os que devolvessem, pois os cachorrinhos já se apegaram. – Sérgio sorriu, Rafaela tinha razão, mas logo ficou sério novamente.
 - Ela também perguntou sobre você. – Sérgio agora prendera toda a atenção no irmão.
 - Sério? – Ele sentiu o estômago se reprimir.
 - Sim. Ela disse que o pai pediu para não vir vê-lo por enquanto, para esperar que você se recuperasse completamente, disse também que já estava ficando louca com isso... – Sérgio sorriu mais ainda – E que se você não melhorasse logo, ela teria que te incomodar seria o único jeito.
 - Não vejo problema algum em ela vir me ver, eu já estou bem. – Ele apontou para si e percebeu o olhar do irmão sobre seu abdômen que tinha uma longa faixa enrolada. – Isso não é nada, Marcos, você viu como estava o rosto da Rafaela? – Ele encolheu se lembrando de como estava a garota.
 - Não está tão ruim. Ela deve ter o sangue muito bom, já está cicatrizando, mas o rosto dela ficou muito ferido. Quando ela veio aqui ela estava com aquela blusa de uniforme regata, deu pra ver que os ombros dela estavam bem machucados, e os braços estão com marcas roxas...
 - Ta, já chega Marcos, obrigado. – Ele tinha que ver Rafaela. – Quantas horas? – O irmão olhou em seu relógio de pulso.
 - Uma e quarenta e cinco. – Rafaela já ia ser liberada.
 - Eu vou tomar um banho. – Ele se levantou, com um pouco de dificuldade, e foi até o armário, escolheu um short jeans e uma camiseta pólo, seguindo para o banheiro.
 Os banhos agora eram mais demorados, pois ele tinha que tirar as ataduras, lavar com muito cuidado e depois refazê-las. Quando Sérgio terminou seu banho já eram duas e meia, Rafaela já devia estar em casa.
 - Marcos, Laísa, estou indo ali, já volto. – Sérgio ouviu sorrisinhos antes de sair, mas não ligou.
 Rafaela estava sentada em seu confortável sofá da sala, se olhando em um espelho do outro lado da sala. Ela não conseguia aceitar tudo que acontecera, seu rosto tinha arranhões por todos os lados, sua pele estava arroxeada. Ela suspirou. Manhoso a lambia incessantemente. Aquilo lhe fazia sentir melhor, já que nem Sérgio pudera agradecer, nem ao menos ver o rosto dele. Ela suspirou mais uma vez e a campainha tocou, ela se afundou mais nas almofadas, não queria receber visitas.
 - Rafaela. – Ela reconheceu a voz de Rodolfo chamar. Ela respondeu sem ao menos olhar quem era.
 - Não quero ver nem falar com ninguém Rodolfo. – Ela se afundou mais, e Manhoso pulou sobre ela indo até Sérgio.
 - Não acha que deve ao rapaz ao menos agradecimentos? – Rafaela se levantou com rapidez e ficou imóvel olhando para Sérgio, que sorria. Ela abriu a boca para falar algo, mas a fechou, ela corou e então se dirigiu a Rodolfo.
 - Ah, obrigado Rodolfo! – Rodolfo acenou e se retirou. – É... Sente-se Sérgio. – Ela pediu e lhe mostrou o sofá. Ele seguiu até onde ela apontara e se sentou, impressionado com o conforto do sofá.
 - Poxa, esse sofá é realmente bom, como um desses quem precisa de cama. – Rafaela sorriu sem emoção, não sabia o que dizer. – Você ainda sente muita dor? – Sérgio perguntou tirando-a de seus devaneios.
 - Sim... Meu abdômen também dói, mas eu tive a sorte de não fraturá-lo. – Ela o fitou. – Deve estar doendo muito. – Ela franziu o nariz. – Ah Sérgio, eu sinto muito, você não deveria...
 - Não diga bobagens Rafaela, pelo menos uma vez na vida. – Ela se calou e abaixou o rosto. – A única coisa que me faz feliz por agüentar essas dores é saber que eu te salvei. – Ela ergueu o olhar e engoliu seco.
 - Eu só não sei como você...
 - Assim que você correu eu fui atrás de você. Demorei um pouco porque não queria ir, você tinha que ficar sozinha, mas algo me fez ir, e então a Malu me parou lá no salão e tive que inventar uma desculpa, e quando consegui sair já tinha perdido seu rastro, e então quando te encontrei... – Dessa vez ele engoliu seco, fechando as mãos em punhos, e Rafaela se arrepiou, lembrando de tudo.
 - Eu não quero lembrar disso. Não que eu consiga esquecer, mas... – Ela balançou a cabeça como se tentasse afastar os pensamentos. – Eu nem sei o que dizer Sérgio. Na verdade... Eu sei. – ele a fitou intensamente e ela corou. Ela pigarreou e continuou. – O Rafael se transformou em um monstro, ele meu deu socos no rosto, me jogo no chão, puxou meus cabelos... Eu senti a morte se aproximando, eu já tinha me entregado, estava pensando nos últimos momentos felizes que tive... Todos com você, com a Laísa... E quando eu abri os olhos, e vi você lá batendo nele, eu senti que tinha que lutar era uma obrigação. – Ele a ouvia atentamente. – E, depois de tudo aquilo, eu pensei, muito. Eu fui idiota com você desde a primeira vez que nos vimos, e olha o que você me dá em troca? Minha vida. – Seus olhos estavam marejados, e sua voz meio embargada. – Desculpe! Desculpe por te humilhar, desculpe por te destratar, desculpe! – As lágrimas começaram a rolar, Sérgio quis sentar ao lado dela, mas se conteve. Ela limpou as lágrimas com as costas da mão e continuou. – Eu acho que... Acho que gosto de você Sérgio. – Ela baixou a cabeça, e Sérgio sorriu bastante feliz.
 - Você acha? – Ela ergueu a cabeça.
 - Não! Eu realmente gosto de você, eu não agüentava mais ficar longe de você, sabendo que você estava ferido por minha causa, e agora sei que você não vai me querer porque sempre fui uma idiota, te tratei mal por sua cor, que na verdade não faz diferença alguma, e você só mostrou ser o contrário de tudo que pensei, e agora, além de tudo isso, eu estou horrível, tenho cicatrizes por todo o meu corpo, meu rosto está horrível! – Ela falou tão depressa que quase tropeçou nas palavras, ainda chorando.
 Sérgio se aproximou, colocou uma mecha de seu cabelo atrás da orelha e olhou no fundo dos olhos dela, passando a mão sobre os ferimentos em cicatrização.
 - Isso só te tornou mais bonita Rafaela. Mostrou o quanto você teve bravura, passou por muito mais que eu, e nem por isso está de cama. – Ele beijou a cicatriz. – E eu te desculpo por tudo. – Ela o abraçou com toda força que tinha, e ele ignorou a dor que sentiu, pois o prazer de tê-la o abraçando foi muito maior.
 - Eu te amo. – Ela cochichou em seu ouvido.
 - Eu te amo mais. – Ele sussurrou no dela.

 Rafaela recebera um sinal, um sinal de Deus. Mostrara-lhe, que as pessoas não se julgam pela cor, e sim por suas ações. Ela julgara Rafael melhor do que Sérgio por ser branco e rico, ignorando todo o resto, e quase deixou escapar entre os dedos, um rapaz inteligente, bonito e trabalhador, que por mais humilhado que foi, não a abandonou no momento de precisão. Para ela aquele fora a maior lição de sua vida, e realmente fora. Aprendeu que um livro não se julga pela capa e sim pelo conteúdo adentro. Deus lhe deu uma segunda chance, assim como Sérgio. E ela reparou todos os seus erros. Seu preconceito? Esse fora curado com muitos beijos e abraços de seu namorado. Um negro. Chamado Sérgio. Que lhe fizera descobrir o que é o amor. E mudara seu nome para Rafaela Araújo, anos depois.

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